O fiofó da discórdia
Uma leitora do blog Toca do Leão escreveu dizendo-se chocada, surpresa, assombrada com a minha confidência de que estava sofrendo um problema de saúde na região anal. Ela desconfia que sou fresco enrustido, um maricas que não saiu do armário. Já meu compadre blogueiro Tião Lucena, com sua verve, com graça e vivacidade em tudo que produz, reproduziu no seu canto da net minha croniqueta falando da crise no boga. Todo mundo e a mulher do seu Raimundo, como diz Tião, preocupou-se com a ruela do velho Leão.
Agora eu fico daqui analisando esse caso, um nítido preconceito contra essa parte do corpo humano, de tanta utilidade na hora de descomer, e que se usa também para os prazeres da carne, sendo como é uma zona erógena altamente qualificada, conforme atestam muitas mulheres e a turma da bandeira multicor. Para combater esse sentimento desfavorável ao anel de couro, o cientista social e artista visual Pedro Vieira da Costa Filho ficou nu e retirou um rosário do ânus na frente dos presentes à abertura do XIII Salão de Artes Visuais da cidade de Natal. Ainda recebeu cachê de R$ 1.500 pela performance. O artista explicou que o ato foi contra a “descolonização” do corpo e para expurgar a interdição católica sobre o prazer anal. O crucifixo poderia entrar pela boca ou pelo ouvido. O fato de ter gerado polêmica porque entrou pelo ânus é mais um preconceito. A madona também fez isso com o crucifixo.
Não tenho nada com os oitis de ninguém, não entro nessa polêmica nem que a vaca tussa, mas taí um exemplo de que as pessoas veem o fiofó de forma preconceituosa e controversa. Outro artista, esse baiano, de nome Tom Zé, em plena ditadura militar passou um pitu na censura federal, lançando um LP cuja capa estampava seu próprio ânus com uma bola de gude no olho do furacão. Quem olha vê o órgão da visão, azul e calmo. Também era protesto, mas contra o rigor da censura.
Não, minha comadre leitora, não sou gay e nem preciso provar nada para ninguém. Também não tenho qualquer atitude de ódio ou repulsa a quem seja homossexual. Defendo o direito de todos disporem de seus corpos da forma que desejarem, como bom anarquista que busco ser, apesar das limitações de nosso momento-acidente. Mas fico com o pé atrás com relação a pessoas que ficam escandalizadas à simples menção do nome ânus. Visitando a blogosfera, vi/ouvi um vídeo de pastor médico ensinando aos fiéis de sua igreja como “limpar o cu”. Muita gente ficou escandalizada com a expressão usada pelo pastor, mas ele estava falando para pessoas analfabetas, a maioria não sabe o que significa “ânus”. Vai no popular mesmo!
O assunto tratado com certo humor é de extrema importância do ponto de vista da higiene pessoal. No antigo Egito, existiam profissionais para cuidar especialmente dessa anatomia humana nos faraós. O pastor faz o papel de palestrante motivacional, motivando os fiéis a lavar o cu e não só limpar. É como escovar os dentes, tem que aprender a técnica. Por que ficar indignado e ofendido por ouvir palavras do vocabulário popular que significam partes do corpo humano? Seria o ânus mais sujo ou mais indigno do que a boca, por exemplo? Em uma ilha do Caribe, é costume as pessoas se beijarem no ânus, como sinal de respeito e consideração. Apesar da palavra chula, o pastor foi educativo. Se bem que na minha opinião, chula é a própria palavra chula. Palavrinha feia da gôta, seu menino!
Portanto, vamos encerrando aqui esse papo de proctologista, registrando essa realidade: existe uma fobia do ânus, uma enorme repulsa a esta parte do corpo humano. O preconceito vai até ao ponto de prejudicar a saúde do camarada que se recusa a fazer o exame de próstata. Eu já fiz meu exame e ainda não virei fresco. Apesar da desconfiança de minha leitora.
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