EU? MATO A COBRA E MOSTRO
O casal havia mudado para o casarão pouco mais de três meses. Ele espanhol, carregando um sotaque português para ninguém botar defeito. Isso mesmo, não errei no idioma não. Ela, uma mulata à la Sargentelli, “brigueeeenta” feito um cão – palavras dele ao se referir a ela – que não dispensava uma bicicleta, sempre desocupada para qualquer precisão. Quatro filhos, todos no exterior.
Eu, acostumada ao silêncio, pois a vida me colocou ali, vizinha de casas onde só moram almas – boas, diga-se de passagem – e passarinhos, no meio de domingos passei a ser surpreendida por vozes alteradas. Em sábados gloriosos, de chuva fininha e aquele friozinho que mordisca a espinha de cima abaixo, despertada por chamados impertinentes e convulsivos. “Aguillaaaaraaaa, abre aqui! Ô Aguillaaraaaa!”. Bom, nos demais dias da semana a rotina é a mesma. Algumas palavras malcriadas, chamados incessantes, respostas atravessadas, na maior altura. Mas como passo a maior parte do tempo fora... Se me perguntarem se me incomoda, digo que não. Deixo para lá. Mas, me assusta!
Dia desses, ainda na cama, de chamego com meus livrinhos, na paz com meus dogs completamente acorrentados à preguiça das manhãs, emergem, do nada para o sol fresco do dia, punhados de palavras que se espalham por todos os telhados. Do quarto, nitidamente, só deu para ouvir a palavra cobra. Nem precisou de mais. Durmo com janelas abertas, durmo na rede da varanda mas, falou de cobra, já estou lá na esquina. Foi mesmo que jogar uma pedra na minha vidraça. Pior, balde de água gelada na cama. De pulo só, já estava trocando minhas roupas, pronta para sair. Cobra de um lado, pau do outro, mato, faço e aconteço. Um falava de cá, outro gritava de lá, ao mesmo tempo. Mas eu, de todos os lados só tinha presa aquela figura apavorante da víbora pronta para o bote.
Abro o portão e dou de cara com os dois. Ele, “comigo é assim mesmo e não tem escapatória. Mato a cobra e mostro o pau. Pra valer!” Ela, “ E daí? Eu? Mato a cobra e mostro a cobra morta, que é pra acabar logo com a história!”.
Claro, fiquei tanto sem graça, disfarcei, tranquei o portão e já que estava mesmo na rua, fui comprar pão. Fazer o quê?
O casal havia mudado para o casarão pouco mais de três meses. Ele espanhol, carregando um sotaque português para ninguém botar defeito. Isso mesmo, não errei no idioma não. Ela, uma mulata à la Sargentelli, “brigueeeenta” feito um cão – palavras dele ao se referir a ela – que não dispensava uma bicicleta, sempre desocupada para qualquer precisão. Quatro filhos, todos no exterior.
Eu, acostumada ao silêncio, pois a vida me colocou ali, vizinha de casas onde só moram almas – boas, diga-se de passagem – e passarinhos, no meio de domingos passei a ser surpreendida por vozes alteradas. Em sábados gloriosos, de chuva fininha e aquele friozinho que mordisca a espinha de cima abaixo, despertada por chamados impertinentes e convulsivos. “Aguillaaaaraaaa, abre aqui! Ô Aguillaaraaaa!”. Bom, nos demais dias da semana a rotina é a mesma. Algumas palavras malcriadas, chamados incessantes, respostas atravessadas, na maior altura. Mas como passo a maior parte do tempo fora... Se me perguntarem se me incomoda, digo que não. Deixo para lá. Mas, me assusta!
Dia desses, ainda na cama, de chamego com meus livrinhos, na paz com meus dogs completamente acorrentados à preguiça das manhãs, emergem, do nada para o sol fresco do dia, punhados de palavras que se espalham por todos os telhados. Do quarto, nitidamente, só deu para ouvir a palavra cobra. Nem precisou de mais. Durmo com janelas abertas, durmo na rede da varanda mas, falou de cobra, já estou lá na esquina. Foi mesmo que jogar uma pedra na minha vidraça. Pior, balde de água gelada na cama. De pulo só, já estava trocando minhas roupas, pronta para sair. Cobra de um lado, pau do outro, mato, faço e aconteço. Um falava de cá, outro gritava de lá, ao mesmo tempo. Mas eu, de todos os lados só tinha presa aquela figura apavorante da víbora pronta para o bote.
Abro o portão e dou de cara com os dois. Ele, “comigo é assim mesmo e não tem escapatória. Mato a cobra e mostro o pau. Pra valer!” Ela, “ E daí? Eu? Mato a cobra e mostro a cobra morta, que é pra acabar logo com a história!”.
Claro, fiquei tanto sem graça, disfarcei, tranquei o portão e já que estava mesmo na rua, fui comprar pão. Fazer o quê?