Linha Assassina
Eu cresci entre a vida pacata de um bairro de classe média em Feira de Santana e outro da periferia de Salvador, na Bahia; fui uma criança normal que brincava de tudo que era possível na época, ia à escola, tinha amigos e até aprontava as peraltices que toda criança apronta; já empinei pipa, que na Bahia se chama ARRAIA, mas nunca o fiz com as tais linhas temperadas, que hoje é moda se chamar de CEROL.
Meu pai, linha dura, sempre me disse que aquele tipo de atividade era coisa de desocupado e criminoso, afinal de contas, além de provocar a ira de quem também empinava outras pipas, as tais linhas com cerol causa sempre muitos estragos em pessoas e nos fios elétricos dos postes; muitas vezes eu próprio já vi curtos circuitos com explosões em transformadores e por várias vezes a rua onde eu morava ficava sem eletricidade por várias horas por causa das linhas que conduzem, também, eletricidade.
Os casos de mutilação ou de morte com a linha assassina? Estes eu também cresci vendo os montes e de todos os tipos; minha amiga Maynara Lima, jornalista que hoje mora na bela Caruaru, por pouco não perde a vida quando passou de moto por uma destas linhas que sustentam pipas; os jornais não se cansam de noticiar as mortes e milhares de acidentes gravíssimos que as linhas provocam, mas em sendo assim, porque as pessoas continuam empinando pipas e utilizando cerol?
O que não falta é gente interessada neste negócio assassino, de criança infratora até adultos criminosos; cidades como Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador e Belo Horizonte, principalmente nas periferias, milhares de pessoas permanecem inertes aos sinais de perigos e as advertências legais e continuam comprando ou preparando elas próprias as linhas de algodão temperadas com vidro moído e cola; a mistura da morte já deixa em alerta os motociclistas e ciclistas que atravessam ruas e avenidas vulneráveis ao perigo.
Em Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul, uma equipe de policiais civis comandados pela exemplar delegada Maria de Lourdes Sousa Cano, sai pelas ruas e leva quem é flagrado usando linhas com cerol para a delegacia; isso mesmo, todos que são flagrados utilizando às linhas assassinas a equipe da Dra. Maria de Lourdes Cano, literalmente entram pelo cano; pode ser adulto, criança, mulher ou idoso.
Quem apóia o projeto é o Magistrado Estadual Danilo Burin, também de Campo Grande; para o juiz da Vara da Infância e Adolescência a atuação da polícia para coibir a ação de quem intenta contra a vida, seja adulto ou criança, serve para formar o novo cidadão!
Insatisfeitos com a ação nefasta das linhas temperadas com vidro moído os criminosos adoradores da matança foram buscar outro tipo de artefato ainda mais perigoso; trata-se de uma linha reforçada que eles chamam de linha chilena, feita a partir de materiais muito mais resistentes do que os tradicionais algodões e temperada em fábricas profissionais com uma mistura de cola mais resistente, pó de mármore e um composto de alumínio. O efeito desta nova linha é pelo menos 20 vezes mais cortante do que as linhas amadoras que já estamos acostumados a ver voando pelo céu do Brasil.
Um teste feito por uma televisão provou que a linha chilena pode cortar facilmente uma maçã sem nenhum obstáculo e ainda consegue serrilhar um tubo de PVC ou um cabo de vassoura. Estas linhas são a substituição do antigo crime pelo novo delito e desta vez com requintes de crueldade e aplicação flagrante de dolo; enquanto um tubo de linha comum, a antiga, já temperada com vidro custa em média R$ 15,00 a linha chilena com mármore e alumínio custa, segundo fontes da internet, R$ 45,00. Se alguém me disser que a utilização desta nova linha é meramente para diversão eu chamo de louco e conivente!
Eu jamais entenderei a motivação que faz alguém utilizar uma linha altamente cortante para fazer voar um brinquedo tão inofensivo; se alguns dizem que estas linhas servem para cortar as outras linhas que atravessam em suas frentes, provocando uma disputa, há os que comprovadamente atestam que elas matam mais do que divertem e isso por si só já é uma justificativa para que elas sejam banidas em definitivo e seus usuários presos por tentativa clara de homicídio.
Da mesma forma que os balões que provocam incêndios e igualmente matam e os motoristas bêbados, quem usa cerol é tão criminoso quanto quem porta uma arma e não possui poder legal para tal; inocentes que sequer sabem da existência destes artefatos, quando fortuitamente atravessam na frente delas acabam sendo cortados na altura do pescoço e muitos sequer conseguem chegar ao hospital para receberem o socorro!
Mais uma vez a ignorância de alguns associados ao caráter criminoso de outros faz com que o Estado pague uma conta altíssima, seja em socorro com o deslocamento de bombeiros e médicos do SAMU, seja no pagamento da conta dos hospitais e por fim, quem de fato paga esta conta salgada somos nós, contribuintes!
Se as polícias do Brasil seguirem o modelo da polícia do Mato Grosso do Sul e os juízes observarem melhor os atos do Dr. Burin, com certeza esta cambada de malfeitores acéfalos e criminosos se sentirão refreados na liberdade e isso dói na vida de qualquer um; porque dizer que uma conversa franca com eles resolve alguma coisa, isso eu duvido!
A foto que se vê em destaque no corpo deste texto mostra um motoqueiro que passou por uma destas linhas e teve parte do pescoço degolado e morreu na hora, antes mesmo que alguém pudesse chamar o socorro. Neste caso em especial, segundo a reportagem, os autores que estavam brincando com pipas numa região do interior de São Paulo eram todos menores de idade e permaneceram no local; quando indagados eles disseram que estavam brincando e jamais imaginaram que um dia isso fosse acontecer.
Uma semana após a morte deste infeliz que cruzou o caminho do Cerol, mais crianças e adultos estavam brincando no mesmo lugar, com o mesmo tipo de linha e ninguém sentiu qualquer remorso. Um deles ao ser indagado mais uma vez, disse que os motociclistas e ciclistas deveriam (pasme) utilizar os suportes que desviam os pescoços das linhas...!
Após tantos exemplos e acidentes que poderiam facilmente ser evitados, se as linhas não estivessem temperadas, da próxima vez que você flagrar alguém usando cerol, uma das boas alternativas é chamar a polícia e denunciá-lo sem piedade ou a próxima vítima a estar estirada no asfalto poderá ser você mesmo...!
A respeito de minha educação, graças a Deus os meus dois filhos adolescentes também não gostam de empinar pipas e isso me deixa ainda mais confortado por eles não terem chance alguma de se tornarem criminosos!
Carlos Henrique Mascarenhas Pires
Meu site: WWW.irregular.com.br