Notícias dos velhos coronéis (2)
Meu pai tem 80 anos, e sente uma alegria de menino quando começa a contar as histórias de sua meninice na velha Itabaiana. Estamos fazendo uma série de entrevistas com ele para um documentário a ser montado brevemente. Muita gente não tem a sorte de amadurecer tendo seus pais vivos, testemunhas lúcidas de um tempo mágico, que é o período de nossa infância e juventude.
O cidadão Pinto Ribeiro, comerciante e político, foi prefeito de Itabaiana de 1942 a 1945. Meu pai Arnaud Costa conheceu de perto essa figura, dono da “Casa do Povo”, loja que ficava parede meia com “A Barateira”, de Inácio Ramos Cavalcante, pai do poeta Damião Ramos Cavalcante. Pinto Ribeiro era um sujeito metódico, cheio de manias. Um munícipe, encontrando-o na rua, procurava trocar uma palavra com o prefeito, e ele:
− Quer falar com o Chefe do Executivo, com o comerciante ou com o cidadão Pinto Ribeiro?
A ralé era tratada com desdém pelo esnobe prefeito. Na Prefeitura trabalhavam três irmãos, conhecidos por Cajá. Acho que foram esses caras que inspiraram o dramaturgo Dias Gomes na criação das personagens irmãs Cajazeiras, do seriado “O bem amado”. Os Cajá eram uns tipos fofoqueiros. Dos “Cajá” posso dizer que pelo menos um deles não morreu. Esteve ontem no Ponto de Cultura Cantiga de Ninar com sua língua afiada e seus ditos maldosos. Se não é a reencarnação de um dos Cajá, certamente é um desses fofoqueiros de plantão, comuns nas cidades pequenas.
Pois um dos irmãos Cajá foi flagrado falando mal do prefeito Pinto Ribeiro, que o demitiu na mesma hora. Para sobreviver, o Cajá desempregado foi vender doce americano pela rua, cantando o refrão:
− Olha o doce americano, sem precisar do prefeito eu vou levando...
Diante da petulância do doceiro, Pinto Ribeiro ordenou sua imediata prisão por desacato à autoridade.
Quase que me esqueço de mencionar outra ocorrência na mesma linha do ridículo provinciano. Era o Doutor Antonio Santiago outra figura muito grave e metida a importante. Prefeito do lugar, teve que se ausentar da cidade para tratar de um problema de saúde. Ao voltar, foi cumprimentado pelo poeta Agenor Otávio:
− Nobre prefeito, como vai de saúde?
−Estou melhor, obrigado – respondeu de má vontade o Prefeito.
Na qualidade de fiscal de feira e bom conversador, Agenor saiu dizendo a todo mundo que o seu prefeito estava bem de saúde. Sabendo dos comentários, Dr. Santiago ditou portaria ao seu secretário nos seguintes termos:
“No uso da atribuição que lhe confere a Lei, o Prefeito Municipal de Itabaiana resolve demitir o servidor Agenor Otávio, por motivo de especular sobre a saúde do Chefe do Executivo”. Depois, reconhecendo que o documento era destituído de bom senso, mandou cancelar a demissão do fiscal. Os juristas atuais situariam o caso no tal “princípio da insignificância”. Como são insignificantes os que se mostram tão arrogantes!