Banda "Os Magnatas" - L'amour Enterdit.

Banda "Os Magnatas" - L'amour Enterdit.

Andei publicando uns textos com o título de "Standards - as músicas que me balançam", falando de músicas que ouvi e, que por algum motivo ou outro, me impressionaram e guardei na memória. No último texto, fazendo um comentário da música "Je t'aime... moi non plus", fiz referência à banda de baile que existia em Turvânia/GO, que existiu até o começo dos anos 90.

"Os Magnatas" eram remanescentes de uma época em que toda cidade tinha lá a sua banda de baile - febre que começou lá pelos anos 60 e que só acabou com a chegada da animação de festas com som mecânico e, depois, o aparecimento da figura dos DJs e, enfim, o chamado "som automotivo".

Na última e mais duradoura formação, a banda tinha Braizão no baixo, Pelé nas guitarras, Paulão nos teclados, Tonho Baguá na bateria, todos egressos de outras bandas e histórias de vida.

Pelé, veio de longe - havia uma lenda em torno de uma suposta participação sua na banda RC-9, antes de começar a ter problemas com o alcoolismo. Braizão andou longe, mas era da cidade. Tonho Doideira, era de Rio Verde/GO. E Paulão, se não me engano, também tinha nascido na cidade.

Quando criança, eu e a turma gostávamos de passar na casa do Braz, voltando do banho no ribeirão dos Moleques, para ver os ensaios. Sempre estavam lá, no meio de um enrosco medonho de fios e tomadas, ensaiando música nova - ou velha (para corrigir certas mancadas, das quais vou falar daqui um pouquinho), entrementes os choques que levavam, tentando regular os amplificadores valvulados.

Na primeira vez que fugi de casa para ir a um baile, eram eles que estavam tocando, ainda com o nome de "The Best Sound", que, na época, ainda tinha Chico Doido na batera, Lindomar como crooner e Rui (hoje, Rui César, que ainda anima as noites de bares, boates e festas, na região de Goiânia e tem um filho talentoso que o seguiu na carreira e já é maestro!), na guitarra solo*.

Como eu gostava de arranhar um violãozinho, sempre que ia a um baile no Salão Paroquial ou no São da Prefeitura, ficava algum tempo perto do palco, pra ver a banda em ação, e "sentir" o som perto das caixas amplificadas. Logo, recebia a saudação da banda, pelos microfones do Pelé ou do amigo Tonho.

Ver a banda tocando era um negócio fora de série. Tocavam e cantavam bem e, os músicos eram muito comunicativos e bem humorados. De vez em quando, entretanto, alguém atravessava o ritmo, ou esquecia um trecho da melodia - exceção feita a Paulão, que atravessava ou esquecia sempre sempre.

Nessas horas, Pelé, o veterano do cabelo esvoaçado (à la Don King) e que portava sua famosa guitarra de dois braços, pintada de verde (música "normal", na guitarra de seis cordas e música sertaneja só na guitarra de doze cordas), olhava de lado, numa censura evidente e medonha do companheiro.

Tonho, em algumas ocasiões - especialmente quando ele fazia uma misturada de certos produtos (e, não era leite com manga, estão me entendendo?), dava trabalho. Começava a acelerar o ritmo da bateria e, chegava a um ponto que, Pelé ou Braz simplesmente interrompiam a execução da música e saiam para esfriar a cabeça e dar uma dura no companheiro. Mas, na hora das seleções de forró, Baguá sabia bem o que fazer. E Braizão, ia na dele, fazendo a "cozinha" na maior alegria.

No forró, "Os Magnatas" convenciam e levantavam a galera. Pegavam os velhos clássicos, passava pelo forró nordestino e, chegava aos sucessos mais novos. A pista lotava de gente e, aquilo ia por mais de duas horas, até a hora do intervalo - quando a gente ia para a rua, sentir a brisa fria da madrugada.

Nos bailes de formatura das turmas do colégio estadual (quando a gente tinha que alugar a mesa com meses de antecedência), a banda justificava seu nome, se apresentando em traje de gala - terno branco e, camisa azul clara, naquele estilo de roupa do final dos anos 70. E, os convidados para a festa, não podiam fazer por menos, pois tinham que vestir "social" - nada de jeans ou camisa em mangas.

Na hora da valsa, porém, não sei bem porque, tocavam - um ano após outro, uma valsa feita em cima da melodia de uma música erótica francesa "L'amour Enterdit" (as, é claro que tiravam o vocal feminino, que na música original começa cantando e vai indo até a simulação de um invejável orgasmo).

Valsa para os formandos: "L'amour Enterdit". Valso para os pais dos formandos: "L'amour Enterdit", de novo. Valsa para os padrinhos dos formandos: também. Valsa para o Prefeito, "primeira-dama" e Vereadores: idem.

Eu e meus amigos ficávamos numa mesa lá atrás, na ponta dos pés, tentando assistir tudo, tentando enxergar além do pessoal que cercava a pista de dança, para ver a dança das valsas de perto.

Vendo os Magnatas suando dentro dos ternos, os noviços na dança da valsa se arrastando e atropelando pelo salão, a música de origem erótica e, umas cervejas a mais na cabeça, sempre me faziam rir catatonicamente. E aí, os amigos (que incluíam meus primos e meu irmão Edilson) me davam cotoveladas nas costelas, tentando me fazer calar.

* o principal motivo de ter ido às escondidas ao tal baile foi jassistir o Rui tocar sua sua famosa guitarra-solo branca que eu, menino de tudo, entendia que era, imaginem, uma "guitarra sol", isto é, um instrumento do qual saísse luz, calor, algo assim...

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O tempo das bandas de baile foi passando e, não existe mais. Depois que "Os Magnatas" encerraram suas atividades, cada um dos ex-componentes foi cuidar da vida, como podia.

Braizão foi ser agricultor, mas uma diabetes o pegou e o fez definhar e sucumbir rapidamente.

Pelé mudou-se com a família para Nazário/GO. Distante do mundo da música, mergulhou em crises cada vez mais frequentes de alcoolismo até ser encontrado morto à beira da rodovia GO-060.

Tonho foi-se embora para Rio Verde/GO (mas, antes disso, foi até minha casa e me deu dois discos do Milton Nascimento de presente, dizendo que já não tinha mais motivo nem paciência para ouvir). Lá, virou motorista de caminhão e, até onde sei, vai vivendo.

Paulão, desceu para o Mato Grosso e, não sei bem o que anda fazendo atualmente.

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Deus!, que saudades daqueles bailinhos, da banda "Os Magnatas", de tirar as meninas para dançar, de me entreter em longos papos e, beber com os amigos numa mesa ao lado da pista de dança e, de viver uma noite de alegria e sonho...

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Esta é uma sincera homenagem aos músicos da banda que fazia a alegria da gente da minha cidade.

E dedico a Edilson, Velúzio, Zezé, Valtenir, Dadino, "Gordo", Divino, Zezinho, tio João, tio Pedro, tia Iolanda, Donizete, Osmar, "Lorinho", Edmilson, Selma, e todos aqueles com quem convivi nos bailes do Salão Paraquial, Salão da Prefeitura, Barraca da festa de São Gregório, e Zizito's Disco Club (que é um caso à parte, sobre o qual ainda vou escrever).