O poeta foi preso!
Na época do regime militar, os centros acadêmicos eram acompanhados de perto por agentes infiltrados. Alguns deixavam-se conhecer, para que os colegas permanecessem no sigilo.
Sai no jornal da faculdade uma discussão sobre professores que não davam aula, mas seu assistente. No meio do artigo, a citação “pois como já diz Luiz Carlos, pedradas não atingem os justos”. Prisão tão logo avistado o articulista.
Os colegas procuram rápido um amigo que já se sobressaía. Advogado novo, quando terminou de ouvir o caso, foi para a Rua Barão de Mesquita, onde era o quartel da Polícia do Exército no Rio de Janeiro.
Entrou sem muita dificuldade; além de conhecido, fizera amizades e namorava a irmã de um segundo-tenente.
Foi levado até o oficial de dia, que mandara executar a prisão. Conversou amistosamente com o major. Explicou o engano.
- E o senhor está pensando que sou algum idiota, doutor?
- De modo algum. Deixa mostrar.
Tirou de dentro da pasta um livro. Lá estava a poesia de Luiz Carlos, que não era o Prestes como imaginou o major. E as pedradas, que não eram contra nem pessoa, nem prédio oficial.
Era a poesia Exortação, de Luiz Carlos da Fonseca, um fulgurante talento. Entregou ao oficial, que leu silencioso.
Exortação
Sofre, mas não declines da confiança
que, sereno, puseste no futuro!
Se és bom, tens o caminho mais seguro:
o bem é uma subida que não cansa.
Sofre, que o sofrimento é uma esperança
em quem deseja revelar-se puro.
- Que fora o claro se não fora o escuro?
Sem sofrimento, a glória não se alcança.
Não te assustem pedradas. Olha o mundo
com os olhos virgens dos relances da ira.
Vê que o solo, ferido, é mais fecundo.
E se tens na alma o Céu, por que temê-las?
As pedras que o homem contra Deus atira,
ao contato do Céu, tornam-se estrelas!
Luiz Carlos da Fonseca
As páginas amareladas do livro, com um solene pedido de desculpas e a afirmação “deveria ter mais leitura. Meu trabalho não permite”, foi-lhe entregue o jovem poeta-jornalista.
Incólume!