PISANDO EM RASTRO DE CORNO
Que dá azar, isso dá.
Por isso, ao sair de casa, cuide para não pisar em rastro de corno. Por via das dúvidas, é melhor sair pela porta dos fundos. Olhe, que fique bem claro: não estou falando por experiência própria. Se falo é porque sou bom ouvinte e gosto de escutar uma coisinha aqui, outra ali, e assim vou enriquecendo a minha vidinha medíocre. Eta, saco sem fundo essa minha vidinha! Veja como.
Certo dia, esquecendo-me dos cuidados acima, saí de casa para ir ao centro da cidade resolver alguns pepinos. Havia chovido a noite toda e manhã prometia. Pra começar bem o dia, quando me dirigia ao ponto de ônibus, um carro passou sobre uma poça d'água a meu lado e... foi um banho daqueles. Pior que o banho eram as porcarias que teimavam entrar em minha boca desdentada. Por um lado foi até bom, pois quando peguei (alguns dizem: tomei) o ônibus, percebi que todos se afastavam para eu passar. Apesar da lotação, fiquei até confortável. De repente, um moleque que estava sentado um pouco adiante olhou pra mim e disse: seu zé, o sinhô se mijou. Não preciso dizer que todos os olhos se voltaram pra mim e a gargalhada troou. Constrangido, nada pude fazer com o desgraçado do menino. Queria dar-lhe, pelo menos, um cascudo. A peste de menino! Também pudera, conforme dizem, menino tem parte com o capeta. E aquele, com certeza, era um de seus capetinhas.
Enfim, cheguei ao destino. Logo ao descer do ônibus, tive a confirmação de que havia pisado em rastro de corno: a chuva voltou a cair e eu havia esquecido o guarda-chuva no ônibus. E tome chuva no lombo, pois não havia abrigo naquele ponto. Felizmente, em dias de chuva - coisa rara no Ceará - não faltam vendedores daquelas estacas travestidas de guarda-chuva. Comprei um por dez reais. E lá vou eu resolver meus negócios. Mais adiante, numa esquina, um pé de vento quase o tirou de minhas mãos. Não gosto de andar pelo centro da cidade. É gente demais! O pior é andar com guarda-chuva sobre uma calçada estreita, como as nossas. É um bater de guarda-chuva com guarda-chuva que não acaba mais. O pior é quando se engancham. E lá ia eu com aquele sombreiro, batendo aqui e ali na cabeça das pessoas. E nesse bate aqui, bate ali, o pior aconteceu. Enganchei o danado na cabeça de uma mulher. E, na tentativa de desembaraçar-me, acabei arranquei a peruca da criatura. A mulher rodou a baiana e não contou pipocas: desceu-me o guarda-chuva na cabeça o quanto pôde. Humilhado, fiquei a pensar: é nisso que dá quando não se olha onde pisa.