SHOW DE CALOUROS

Uma saudade? O show de calouros na minha adolescência. A gente dava a vida pra ir. Cidade pequena, sem atrativos. Qualquer novidade era tudo. Eu amava música, aliás, nunca deixei de amar. Os cantores da terra no palco eram uma glória. E tinha gente boa! Voz bonita, afinadinha, não perdíamos por nada no mundo... Ideia de um sonhador na promoção dos talentos. Coisa de vocação, de vontade de realizar. Tudo simples, meio improvisado. Mas movimentava a cidade.

Prédio do antigo cinema, no centro. Clima dos festivais. Moçada “ouriçada”, com torcida e tudo. A competição era dura. Os artistas ensaiavam pra morrer. Músicas escolhidas a dedo e dedicação total pra não fazer feio. E que músicas! Os grandes sucessos do momento. Tempo do vinil e da radiola. Newton César, Paulo Sérgio, Roberto, Martinha, Wanderléia, Erasmo, Jerry Adriani, Agnaldo Timóteo, Fernando Mendes e tantos outros nomes. Ah, que emoção! As apresentações nos contagiavam. E a gente embarcava seguindo a onda. Aproveitava pra chorar nossas malfadadas paixões adolescentes. Ah, como era bom sofrer!

O evento era aos sábados. A semana durava um ano. Ansiedade total pra ir ao show. Tinham as semifinais e a grande final. Torcidas organizadas. Uma implicância de doer: “Ninguém pode com o Alberto, e aquele esplendoroso ‘O Fim’ do Altemar”. “Quê isso? ‘Dio come ti amo’, na cabeça! A Diná supera até a própria Gigliola, gente!”. Comentários, ti-ti-ti geral. Não se falava noutra coisa. E a premiação? Oportunidade de ir para a televisão. Teve gente no programa do Bolinha e no Sílvio Santos. E não fizeram feio, não! Tinham talento mesmo! Vencer na música naquele tempo? Missão quase impossível. Ir aos programas já era chegar ao céu. Eles na tela em preto e branco, a cidade inteira parada, assistindo. Voltavam gloriosos... Famosos nas ruas...

Tinha um rapaz que “arrasava” com Raul Seixas. Raul era tremenda novidade. “Cara doido” como o povo dizia. Mas a irreverência do Maluco Beleza também nos enlouquecia. A torcida por ele era grande. A moçada ia ao delírio quando o intérprete subia ao palco. Lembro-me do dia em que ele cantou “Tu és o M.D.C da minha vida”. Cheio de entusiasmo começou: “eu dedico essa música à primeira garota que tá sentada ali na fila, obrigado”. A introdução da música é exatamente assim. Mas ninguém conhecia a letra ainda e o cinema inteiro se levantou pra ver quem era a tal garota...

Houve também a noite de uma das apresentações mais esperadas. Ia ser uma loucura! A menina era linda, disputadíssima pelo público masculino. E a voz? Um fenômeno! Quem é que ia perder? A notícia tinha corrido, cinema lotado. As mulheres enciumadas, os rapazes completamente animados. Aquela era a noite! Ela subiu ao palco debaixo de uma chuva de aplausos e assobios (dos rapazes, é claro). O vestido bordado faiscando sob a luz dos refletores, ela pegou o microfone. Suspense! Mas cadê a música que não saía? Ela olhou a plateia à procura de alguém. Pedia socorro. Branco total! “Cumé que cumeça mess, tia?". Foi tudo que seus admiradores conseguiram ouvir naquela noite...