Mulher de verdade não troca blush por brush!

*Publicado no Caderno Mulher do Jornal Agora, Rio Grande - RS, em Abril de 2010.

Outro dia, assistindo a uma propaganda de produtos milagrosos – sim, existem muitas! – fui fascinada por um produto que prometia esconder a sujeira em baixo do tapete, só que na versão estética: “diga-me onde cais que eu te deixarei em pé“. Troço fantástico aquele... Não era bonito, nem parecia confortável, além de caro e nada aconselhável para noites de sedução, mas agradava oito entre dez mulheres consultadas (dados nada confiáveis do fabricante). Entre suas qualidades estava “incrível”.

Incrível é o que uma mulher faz em busca de perfeição! Revira o guarda-roupa atrás de uma peça - que já passou adiante - mesmo com um compromisso dentro de quinze minutos já passados e com o marido ao lado, mantendo um olho nela e outro no relógio. Sofre na academia, na clínica de estética, nas refeições ou inanições. Leva instrumentos cortantes a lugares delicados. Usa sapato apertado e calcinha que não aparece, pois mal existe. E o cabelo então, coitado: enrola, estica e puxa - parece até música da Xuxa! Num dia não pode molhar, noutro não pode secar. E toma substância tóxica para deixar de ser teimoso!

Toda mulher vive num cabo de guerra com a vaidade. Essa relação de amor e ódio a torna profunda conhecedora das técnicas do bom realce e disfarce, mas também a leva ao martírio constante de depilação, salão e liquidação. Isso quando não a escraviza perante o espelho – nenhum olhar alheio pode ser mais cruel que próprio reflexo! A verdade é que o espelho tem sempre a palavra final: se essa resultar em aprovação, ótimo! Lá vai ela, bela e formosa e azar de quem não concorda! Caso contrário, não há elogio no mundo capaz de contentá-la. Isso porque o espelho não reflete apenas a aparência, reflete também a autoestima!

Existe uma regra (ou deveria existir) que diz: “Em dias normais, a relação entre a autoestima e a maquiagem é inversamente proporcional”, ou seja: quanto menor o alicerce, maior o reboco. Mas apesar de toda a vaidade, a mulher de verdade não sabe rir nem chorar esticada. Ela faz caretas, baba e enruga o rosto inteiro durante o processo. Isso quando não arranca os cabelos, agita os braços e contorce o corpo no chão. Ela pode até não se orgulhar dos pés de galinha ou do bigode chinês, mas quando em sã consciência – coisa que nem sempre se leva na bolsa – não troca o bom e velho blush pela modernidade do brush: a máscara que mascara o tempo, criando rostos inexpressivos e indistinguíveis... Um rosto plástico para um mundo plástico, onde não cabem imperfeições.

A mulher de verdade não é feita de plástico! Ela dobra e tem furinhos quando apertada, e é claro que odeia mostrá-los, mas nem sempre tem paciência para escondê-los. A mulher de verdade não se encontra nas capas de revistas ou nos anúncios de lingeries. Não pela beleza ímpar das modelos, afinal elas também são mulheres de verdade; a mulher real não se encontra em anúncios publicitários, pois eles a convertem em pixels e frames, apagando sua essência milimetricamente com alguma ferramenta do photoshop ou de outra poda virtual qualquer, criando assim um modelo abstrato, perfeito – uma mulher virtual.

É claro que mulher nenhuma abomina um bom trato na sua imagem, mas quando esse trato tenta convertê-la em algo que nem mesmo o espelho reconhece, é sinal que o limite foi ultrapassado a alguns quilos de blush ou áreas de brush atrás. É melhor parar quando atingir o famoso ponto “se melhorar estraga”. É fácil reconhecê-lo, fica logo antes do ponto “minha nossa, o que fizeram comigo?”.

E sabe o que é realmente incrível? Pensar em quantas mulheres de verdade estarão lendo esta crônica e iluminando seus rostos com um sorriso genuíno e cheio de expressão! Isso sim é algo incrível!

NOTA: Blush ou Rouge - um produto de maquiagem. Brush - pincel; uma das ferramentas do photoshop (programa de edição de imagens).