INVEJA

Outro dia ouvi uma confidência muito estranha de um amigo. Ele me disse que não gostava de uma pessoa - que é minha amiga - porque ela tem uma boa situação financeira e não sabe o que é sofrimento. Sempre teve tudo na vida e de modo fácil. Nunca sofreu. Confesso que fiquei estático e boquiaberto, sem saber o que responder. Uma afirmação desse quilate é no mínimo doentia. Quer dizer então que ninguém pode ser bafejado pela sorte?

O juízo que os outros fazem de nossos atos nem sempre corresponde com aquilo que sentimos dentro da nossa legitimidade. Tal mecanismo é a mola propulsora da inveja porque os outros vêm à superfície, julgam e emitem a sua opinião sempre no sentido de sentir no caso da inveja as qualidades do próximo, se esquecendo das suas.

A nossa sociedade é baseada na comparação, porque o homem tem na comparação em muitas ocasiões uma forma de aprendizado; na família, por exemplo, todo o processo vive de comparação, pois que, na nossa história familiar é imensa a carga de comparação a que somos diariamente submetidos.

O sistema escolar é todo ele baseado na comparação, como classes mais adiantadas, classes mais atrasadas, notas e avaliações. A força da comparação é tão presente em nossa vida, que poderíamos chamá-la de sangue cultural. E quem não tiver consciência deste processo ao qual é submetido, diariamente, em todos os lugares, em todos os momentos, das mais variadas formas, dificilmente conseguirá sair do seu sentimento de inveja.

Controlar os nossos ímpetos e impulsos comparativos, saturados de ciúme aceitando-nos com sentimentos de auto-estima é uma estratégia. A diferença entre a comparação com os outros e a comparação conosco mesmos difere. Na auto-comparação fortalecemos o nosso ego, estabelecendo o ponto de equilíbrio. Passamos a nos dirigir, em função do que realmente somos e não em função do que os outros esperam de nós. Passamos a ser o nosso ponto fundamental de referência, levando-nos a um fortalecimento interior.

A inveja como vivência de um sentimento interior, sob a forma de frustração, de tristeza, de mal-estar, de acanhamento, pela comparação maligna faz o invejoso sentir-se inferior aos outros, e cria um desequilíbrio íntimo, oriundo do sentimento.

O principal mecanismo da inveja, que é multifacetada, é o ciúme. O invejoso é normalmente inseguro, supersensível, irritadiço, desconfiado, observador minucioso e investigador da vida alheia; sempre armado e alerta contra tudo e contra todos; finge superioridade quando, na realidade sente-se inferiorizado, sendo tal fato o provocador do ar de sarcasmo e de ironia que costuma manifestar. Esse comportamento o leva a exaustão, porque necessita ocultar o seu precário estado de harmonia interior. Enfim, não é fácil sustentar a máscara; o sofrimento deve ser imenso.