A mulher e as fases
A mulher, como já diziam, é feito a lua, vivendo das suas mais distantes fases. Estas que vão do nascimento até o último suspiro. A infância é o ludismo no reino das fantasias e das bonecas em suas casinhas coloridas, as brincadeiras de esconde-esconde sem maldade nem perversidade, a lágrima que por enquanto não tem mágoas nem dores adúlteras. O tempo vai passando, tão rápido como o final de semana de quem trabalha enchendo lajes.
De repente, sente algo se romper no interior e um sangue da inofensiva vagina se escorre, quente como o xixi, em baixo do chuveiro, trazendo uma sensação estranha que percorre pelos sentidos. O coração bate acelerado misticamente pensando no coleguinha da sala em frente. E as mãos adquirem curiosidades e tocam os seios, que despontam como instrumentos pontiagudos se rebelando sob a pele. Querem se libertar! E a menina não veste mais as calcinhas com bichinhos estampados cobrindo as duas nádegas.
Chegou a era da sedução, que provoca outros argumentos chamados de rendas e lingeries, que, minúsculas, se metem a dividir as bandas. São vermelhas, pretas e brancas. As sainhas vão diminuindo até não separar dos shorts quando vistos a olho nu. Acontece o primeiro o amor, o selinho quebrando a timidez e o beijo demorado que pede para ser eterno. Em troca, o primeiro sussurro no ouvido é a entrega sem culpa, a cama improvisada com os uniformes do colégio, os travesseiros, são as lições aprendidas e ainda não lidas.
Por muito tempo, o gosto permanecerá na boca como se o vulcão do prazer lhe despejasse as larvas quentes para engolir. Os dias não são mais os mesmos e um vício adquirido quer saciar-se a todo custo. O amor cresce unilateralmente, até que um dia a solidão entra pelo quarto de confissão, quando o cair da tarde expõe suas cores quentes nos montes ainda claros.
A menina com um cigarro na mão chora intermitente, pensando em se matar de amor. Não encontra motivos para se alimentar nem abrir as janelas em frente aos olhos das estrelas. Mas, o celular toca e as baladas dos ficantes são convites à liberdade.
Adeus, solidão! Adeus, amor eterno! Que seja vivido o manifesto da sociedade alternativa, como pregou Raulzito.
E, desta forma, vai vivendo a mulher sem fronteiras, até que, em outro destes dias, começa a bipartir-se, sentindo que em seu ventre uma vida pulsa, respirando seu oxigênio carbônico e sua nicotina inveterada. Outra vez, a solidão lhe chega antes da meia-noite na escuridão reflexiva, para o choro arrependido da liberdade excessiva.
Novamente, os tempos passam com fugacidade e aquela menina, refém do primeiro vício, conta meia dúzia de crias vindas dos seus prazeres, que agora são assistir a novela e esperar o marido, que passa o dia no trabalho e metade da noite no boteco de César.
Mais uma vez, a solidão invade o seu quarto e, no escuro do ronco embriagado do pai de alguns dos seus filhos, ela deseja a volta ao reino daquela fantasia juvenil que passou empurrado velozmente por ela, que desejou atropelar as fases.
Agora, preferia ficar sem peitos, beijando o espelho e lambendo a vasilha do doce, usando as camisetas sem sutiãs, e os vestidos longos com as calcinhas imensas, correr no pátio da escola brincando sem responsabilidade alguma.
Mas, isto só até amanhã, onde se inicia uma nova fase.