Recados de Jorge Luiz Borges

Jorge Luiz Borges é um poeta e contista argentino, cujo modo de pensar e de viver o torna um dos mais iluminados intelectuais do século vinte.

Para aquela minha amiga cujo sonho é casar de véu e grinalda e outros atavios próprios desse ritual: “Estive casado, mas prefiro falar dos livros. Quero esquecer meus fracassos domésticos. Só posso dizer uma coisa: o casamento é um destino pobre para uma mulher”.

Para meus dois amigos poetas que fazem uma competição absurda entre si para ver quem publica mais livros de qualidade duvidosa: “A publicação não é parte necessária do destino de um escritor. A gente publica um livro para não passar a vida corrigindo rascunhos. Publico meus livros para livrar-me deles”.

Para os autores de hinos cujas letras em estilo floreado são vazias de conteúdo: “Escritos assim não têm o menor sentido. Devemos ver as coisas com nossos próprios olhos e não com os olhos de patriotas de palanque”.

Para outro amigo que gosta de Schopenhauer: “Se o enigma do universo pode ser expresso em palavras, penso que estas palavras estariam em seus escritos”.

Para aquele poeta do cavanhaque, cuja fama tem inflado muito seu ego: “Somente o fato de eu ser quase famoso demonstra que a nossa cultura está em decadência”.

Para meu amigo poeta que já foi vereador e hoje vive circulando em torno de podres poderes: “Não tenho nada a ver com políticos. Para que eles cheguem a um acordo com aquilo que chamam vulgarmente de “massa”, os políticos devem mentir, subornar ou aceitar suborno, em outras palavras: comprometer-se. Um poeta não pode fazer isso, não deve. Ele deve aceitar seu destino como um rei antigo. Sem compromissos”.

Para Heriberto Coelho, livreiro conceituado na praça: “Sou um leitor hedonista: jamais permiti que o meu sentimento de dever interferisse em uma inclinação tão pessoal como a aquisição de livros, tampouco comprei livros grosseiramente - aos montões”.

Para meu amigo religioso: “Creio que em nosso impenetrável destino existe até mesmo a perspectiva de um Inferno e um Céu, porém acredito também que é uma irreligiosidade crer neles”.

Para mim mesmo: “Sei que sou um impostor, no sentido de que fiz muita gente acreditar que sou um escritor. Mas não fiz isso deliberadamente. Essas pessoas, apesar do que escrevi, acreditam que eu seja um bom escritor. Sou um impostor, mas não um impostor consciente”.

Fábio Mozart
Enviado por Fábio Mozart em 19/04/2010
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