Silêncio
Aprontaram tudo: convidaram os pais, escolheram a música e ensaiaram incansavelmente. Prepararam tudo: a ansiedade dos pais, seu próprio nervosismo e as expectativas da apresentação. Não era mais do que uma festa de fim de ano, daquelas de escolinhas infantis. Intimavam os pais, vestiam os alunos com alguma fantasia colorida, selecionavam uma música sobre a alegria de ser criança e ensaiavam um balanço coordenado de pés e braços. Era uma dança simples, mas que sempre emocionava e fascinava os pais, ansiosos pela demonstração do exímio talento de seus filhos. Chegado o dia marcado com canetinha vermelha no calendário, enchiam o salão e testavam o aparelho de som. Os pais sentados e calados. Já estava tudo pronto. Câmeras nas mãos e olhos vidrados. Os pequenos entraram silenciosamente e, dessa vez, perfeitos, finalmente. A professora apertou o “play” e com um rápido sinal, anunciou o início da música. Logo começaram a se balançar, como um cardume que em vez de nadar, dançava. Eles simplesmente sabiam que precisam se mexer e um movimento atraía outro, uma brilhante cadeia de balanços. Os pais não podiam conter-se de alegria, mal podiam acreditar que seus filhos eram capazes de dançar tão lindamente. A música parecia guiá-los, feito mágica. Não podiam pensar em mais nada, senão em como os movimentos de seus filhos acompanhavam a melodia, como aquele balanço era conduzido pelo ritmo. Emocionaram-se, aquilo era tudo do que sempre precisaram. No entanto, eles estavam enganados. No ápice da dança e antes da música repetir mais uma vez o refrão, tudo se tornou silêncio. O aparelho de som pifou e uma música desapareceu. Os pais se agitaram, enraivecidos. “O espetáculo acabou”, pensaram. Mas, se enganaram outra vez, na verdade, aquela música nunca existiu e o espetáculo continuava e parecia ainda mais lindo. As mãos se levantavam e os pés balançavam, uma harmonia perfeita. Não havia música, nunca houve. Pelo menos, não para os pequenos surdos.