SOU O REI DA CASA

Não, não me queixo da vida! Como poderia? Tenho tudo que preciso e muito mais, além de carinho, cuidados, atenção e paparicos em demasia. Por vezes, fico até um tanto enojado com tudo isso pode ter certeza disso. Afinal de contas preciso estar comigo mesmo alguns instantes, longe desse porre de mimos que me empanturra, refletir como bom filósofo da vida que sou, lançar um olhar furioso aos gatos da redondeza, rasgar jornais e documentos encontrados aqui e ali, expressar meus sentimentos de alguma maneira. Mas quem permite isso? Tratam-me como verdadeira jóia rara, que saco! Ninguém se alimenta tão bem e em abundância como acontece comigo, tenho médico à minha disposição praticamente 24 horas por dia. Basta um gesto qualquer de tédio e já correm a levar-me para ser examinado por especialistas.

Sou praticamente o rei da casa, beijam-me e me dão abraços quase sem parar. Aqui eu mando e desmando, faço e desfaço o que quero e meus desejos são imediatamente atendidos. Perambulo para lá e para cá, satisfaço minhas necessidades sobre os tapetes, nos sofás e na frente de todos. Nem bem acabo de sujar, já lá vem alguém pressuroso e feliz limpar tudo. Ah, durmo na cama king size ao lado da mulherona enroscada nos lençóis porém totalmente desnuda, que expulsou o marido para outro quarto para deitar abraçado a mim. Diversas vezes acordei-a lambendo suas nádegas macias como plumas e redondas feito a lua, não sem antes ela gemer e se contorcer entusiasmada, enlaçando-me feliz em seus braços e me dando bom dia em beijos.

Meus adereços, enfeites, roupas e quinquilharias custam o equivalente a anos de trabalho de operários humildes que ganham esse mísero salário mínimo, uma vergonha nacional. Sessões de banho, massagens, acupuntura, entre outras regalias inerentes aos ricaços me tornam quase celebridade. Tenho motorista particular e um carrão esporte para meu uso diário. Provavelmente meus dispêndios mensais alcancem cifras astronômicas, algo em torno de cem mil reais. Mas quem lembra disso, quem é mesquinho a esse ponto? Para ter no lar alfa igual a mim precisa ter cacife - "só tem banco e mulher loura quem pode", já dizia um pobre tolo cabeça de bagre.

Pensam que fica somente nisso? Ledo e incorrigível engano! Quando todos viajam por alguns dias e não me levam junto - o que é raro, reconheço, porém acontece, é a vida - hospedam-me num hotel cinco estrelas com direito a todas as mordomias impensáveis ao mortal comum: banheira com hidromassagem, academia com personal treiner à disposição, refeições internacionais preparadas por chefs de reconhecida competência profissional e muitas outras benesses mimoseantes como poucos tem condições de usufruir.

Bom essa é minha vida, meu rico cotidiano. Que posso fazer se eles me concedem todo esse aparato e ainda acham pouco? É chato ser cachorrinho de estimação de família milionária e madame entediada com a fortuna que possui!

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 15/04/2010
Reeditado em 15/11/2012
Código do texto: T2199594
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