VENDICE (ESTA CASA?) - BIZARRICES DO NOSSO PORTUGUÊS

Li rápido o que estava no portão. O quê? Não acreditei. Olhei de novo, confirmei: VENDICE, uma seta e o desenho de uma casinha. Decifrei na hora! Os donos queriam vender a casa. Puxa, que criativo, era o primeiro anúncio com seta e desenho que eu via. Hum... Aquilo é o que se podia chamar um “anúncio enxuto” ou enigmático se preferirem. Não fosse aquele “vendice”, ponto pra criatividade!

Certa vez, na faculdade, um professor de Comunicação pediu um trabalho. Fotos de letreiros, avisos, tabuletas, placas, tudo que costuma enfeitar muros, portões, vias públicas e paredes do Brasil, e vem escrito nas “formas mais curiosas” do nosso Português, que sabemos, é tão versátil. Fomos então à caça das pérolas que adornavam a cidade. Um verdadeiro achado da mais enviesada ortografia, digamos assim. Montamos um rico álbum com as mais deliciosas preciosidades da escrita popular...

A coisa era de rir, não fosse pra chorar: “Bar copo chujo”, “não choque licho nês locau”, “puribido tiçá o caxoro”, “intreca no dormensílho”, “materiais de construssão enfrente o campo” e outras coisinhas na mesma linha. As bicicletas, porém, merecem aqui um destaque especial. Isso porque na cidade há duas “bikes” por habitante. Então, imaginem: “alficina de biscleta”, “concerto de bicicreta” (sem orquestra, naturalmente)! “pessa de bissicleta”, “gonzerto de bisçicheta” e outras modalidades mais, todas se referindo ao rico universo ciclístico... Triste, não? Ou engraçado?... Sei lá!

Mas, o que o brasileiro se diverte com essa ortografia às avessas, não é novidade! Vídeos, programas de TV, e reportagens exploram largamente o assunto e nos fazem rir de nós mesmos. Sim, porque também tem isso. Somos o motivo da chacota e achamos graça! Também não é à-toa que temos a fama de ser um povo bem humorado, alegre, caloroso, e por aí vai...

Bizarrices ortográficas à parte, lá vou eu caminhar. Ao passar pelo portão não consigo evitar aquele pitoresco “vendice”. Imagino, então, como os negócios estão difíceis. O mercado imobiliário deve mesmo estar em baixa. Há meses passo por ali, e nada de venderem a casinha. Será por questão de preço ou de apreço? Sim, porque está cheio de gente assim: quer vender, mas na hora “h” o coração amolece e o negócio vai por água abaixo... Quem seriam os amorosos donos daquele lar doce lar?

Viro a esquina. Novidades! Hoje vou conhecer a proprietária da casinha bem de perto. Vejo-a de vassoura em punho juntando as folhas na calçada. É uma senhora de vestido estampado, lenço no cabelo e cara simpática. De repente, sai da casa em frente um menino com um prato coberto.

_ Dona Vendice, a mãe mandou uns biscoitos. Acabou de assar...

Dona Vendice? Levo um susto! Automaticamente olho o portão. Agora, sim! O enigma se desfaz: vendice, seta e casinha eram só pra contar que certa dona Vendice era a feliz proprietária de certa simpática moradia. Bem feito pra mim! Azar o meu que até hoje não aprendi a interpretar!

É certo também que há muita especulação sobre as bizarrices de nomes próprios no Brasil. Vendice que o diga! Bom, mas isso já é outro assunto...