Nem tudo dá samba-enredo...
Hoje eu dispenso a fotografia. Não quero imagens. As imagens que vi ontem nos jornais, na TV, ficarão marcadas aqui , na memória do coração, por toda minha vida. Acredito que, pelo menos por algum tempo, na memória da maioria dos brasileiros. Claro, sempre haverá os que esquecerão rapidinho—defesa civil, políticos, que, lamentavelmente, só se “preocupam” depois do leite derramado, do caos instalado. Gostam muito mesmo é de mandar tropas brasileiras, médicos, enfermeiras, bombeiros, para o Haiti, para o Peru – não que eles não merecessem – mas, esquecem da própria realidade brasileira. E ainda aproveitam a tragédia para fazer campanha política! Um absurdo! Os cafajestes não perdem a oportunidade de pegar carona na desgraça alheia. Bom, não quero estragar o que está aqui dentro de mim. Paro por aqui. Este assunto, logo de manhã, dá-me náusea. Não tenho dramim em casa.
Muitos já cantaram o morro do Rio de Janeiro. Herivelto Martins, nos idos dos anos 30, encantou o Brasil na voz de Dalva de Oliveria com sua Ave Maria no Morro—“Barracão, de zinco, sem telhado, sem pintura, lá no morro, barracão, é bangalô. Lá não existe, felicidade, arranha-céus, pois quem vive lá no morro, vive pertinho do céu.” Ontem, o morro inteiro chorou. Desesperou-se. Gritou, lastimou, acudiu , com ferramentas improvisadas, com as mãos, com o coração, as centenas de vítimas soterradas pela avalanche de terra faminta , pior: soterrados pelo descaso das autoridades públicas! O Pão de Açúcar derreteu-se. Cristo chorou. O povo sofreu. A dor alastrou-se por todo coração brasileiro. Deus é brasileiro, sim, a cidade é maravilhosa, eu sei, mas, há que se pensar nessa gente. Há que se dar condições mínimas de sobrevivência a esse povo.Cristo está de braços abertos. Mas, muitos de braços cruzados! Nem tudo dá samba-enredo. Dá tristeza. Dói. Mutila. MATA!
E o Morro inteiro, no fim do dia, fez uma prece: AVE MARIA!
Benvinda Palma