Cárcere Privado
A vida é a experiência do abstrato. Nada temos e tudo queremos.
Desejamos o amanhã para nos redimirmos de ontem. Enquanto isso esquecemos do hoje que passa por nós.
Sonhos são como as cenouras lançadas à frente dos cavalos de corrida e chega primeiro quem corre mais.
Capitalismo selvagem!
Esquecemos do primordial em nome daquilo que chamamos principal.
Ahhh... Bendito dinheirinho!
Renunciamos a tantas coisas em nome dele.
A ação da gravidade marca os rostos e as bocas pesam tanto que já não sorriem, não sobra força.
Tenho medo.
Medo de sufocar meus dias num movimento mecânico de acordar-trabalhar-dormir e me perder nos sonhos dos outros figurados em telenovelas globais.
E a vida lá fora passando.
Acena pra mim lá na rua, livre, enquanto estou na janela cercada de grades.
Na minha prisão de portas abertas eu sou abstrata como a vida.
Tudo se esvai num tempo que não é passível de medidas.
Tenho medo.
Medo da velocidade com que se passam os dias onde me percebo estagnada como em um sono profundo, anestésico.
Medo de acordar daqui a cinqüenta anos e não ter mais tempo de escrever uma única linha gloriosa naquilo que será minha lápide.
Medo de sonhar ser tão diferente e terminar como todos os iguais.