Outono de Lama

Chega o Outono. Todos esperavam que as chuvas de março, que fecham o verão, encerrassem, também, o ciclo de tragédias.

Qual nada, vários municípios do estado do Rio, inclusive o próprio Rio de Janeiro, sofrem o açoite de chuvas fortes e demoradas.

O irrequieto aposentado quebra o silêncio das montanhas mineiras com sua televisão antenada por parabólica e desliza sua nave pelas “águas internéticas”.

Ao mesmo tempo em que o açoite das chuvas enlameia as ruas das cidades, arrasta casas e corpos em desmoronamentos, deputada enlameia a Assembléia Legislativa com pronunciamento em que, ora açoita alguns de seus pares desclassificando-os ora, mesmo mantendo o tom acusador e agressivo, suplica para que aquela casa, apesar de não ser constituída de santos, não se transforme numa quadrilha.

Os jornais dão bastante espaço ao dramatismo das tragédias e, em alguns momentos justificam-nas pela invasão de áreas de risco por sem tetos, para lá fixaram aquilo de mais natural no reino animal: a toca, ou o ninho.

Assim, telespectador, se atento, conclui que a receita desse tipo de tragédia é: necessidade básica, acrescida do desconhecimento total dos grandes riscos, temperada com a ausência do poder público em regular, disciplinar e fiscalizar a ocupação urbana, e regada por chuva forte e demorada.

Mas, apesar de descrente, o aposentado prepara-se para assistir na TV Câmara a votação da Lei “Ficha Suja” de iniciativa popular em que o próprio e mais 1.600.000 (um milhão e seiscentos mil) assinaram, endossando-a.

Infelizmente, sua descrença foi confirmada. Já assistira muitas outras manobras articuladas pelas lideranças dos partidos da base do governo e implantadas pelo Presidente da Câmara, para impedir os parlamentares de votar.

Outra vez confirma sua convicção de que esse parlamento parece mais uma penitenciária: o Presidente da Câmara age como se carcereiro fosse e os parlamentares como prisioneiros, condenados por um Ato Institucional Oculto que caçou seus mandatos.

Tomado de um sentimento enorme de impotência, pois tem ciência da desmobilização nacional, procura quem poderia participar do movimento “Aprovação Ficha Suja e Regulamentação Já, para as Próximas Eleições”.

UNE – União Nacional dos Estudantes?; CUT, CGT e outras centrais de trabalhadores?; outras entidades do gênero? Conhecedor da realidade, responde para si mesmo: não adianta contar com essa turma. A maioria está atrelada aos partidos e aquele comportamento pelego que tanto criticávamos voltou e domina as lideranças de classe. Para quem não se lembra pelego era o adjetivo dado aos líderes que defendiam o interesse de quem os governava.

Complementa que, mesmo naquele tempo, quando o “peleguismo” era comportamento condenado, as categorias sempre estiveram atreladas a um partido e esses decidiam e empurravam goela abaixo das categorias. Além do que nunca existiu um comprometimento dessas organizações voltado para a construção de cidades melhores e de relações sociais mais justas. O que se exerceu foi um corporativismo muito forte.

Descrente de Ong’s, partidos, entidades de classe suas últimas esperanças residem nos aposentados e blocos carnavalescos. Imagina duas possibilidades.

A primeira tenta convencer as lideranças da Associação de Amigos da Terceira Idade e do bloco carnavalesco da pequena cidade do Sul de Minas a organizar, programar e realizar manifestação do movimento.

Entrar em contato com as televisões para divulgarem a mobilização, o que redundaria na mobilização de outras cidades.

A outra, escrever suplicando aos blocos carnavalescos que organizem o dourado da alegria da folia, para contrapor-se ao turvo e fosco da lama produzida pelo açoite do comportamento marginal de muitos de nossos políticos e mobilizem-se em prol da do movimento “Aprovação Ficha Suja e Regulamentação Já, para as Próximas Eleições”.

Alô Cordão do Bola Preta; Banda de Ipanema; Carmelitas; Suvaco de Cristo: Simpatia Quase Amor; Cachorro Cansado; Canarinhos das Laranjeiras; Boêmios de Irajá; Bafo da Onça e todos os outros blocos cariocas. Alô Bacalhau do Batata, Galo da Madrugada; Flor da Lira, Banhista do Prima e todos os outros blocos pernambucanos. Alô Filhos de Gandhy; Oludum; Alerta Geral; Eu Vou e todos os outros blocos baianos.

Enfim alô para todos os blocos brasileiros que queiram com alegria, humor e muita folia participar da limpeza e reconstrução de nossa cidadania enlameada por tanta corrupção.

J Coelho
Enviado por J Coelho em 08/04/2010
Reeditado em 01/07/2012
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