Quem não gostava de Michael Jackson?
Enquanto vejo a morte do Jackson na TV. E fico surpreso com a comoção mundial. Assusto-me também ao ver como sofrem a toa todas essas pessoas!
Notei que tinha de saber um pouco sobre mim, eu, sozinho, sem fé nenhuma, vendo tantos fãs rezando, dançando ou sem acreditar no ocorrido. Minha geração cresceu ouvindo e vendo a criança pobre e negra que se modificou com os anos. Claro que acompanhei a maioria dos meus colegas e vi e ouvi muitas destas músicas do Michael.
Não devemos falar mal de quem já se foi e até confesso sempre gostei do artista Jackson com o seu balanço sua inovadora forma de fazer música e como mudou o mundo do entretenimento, mas como exemplo ele deixou muito a desejar afinal, milhões seguiam o seu modo de vida.
Quando Michael surgiu, eu era uma criança e não estava preocupado com muitas coisas da vida. Eu e muitos achávamos um barato toda aquela onda de dançar e os clipes que contavam histórias com muita inovação e animação.
Um dia, o mundo começou a conhecer um pouco da vida daquela criança que se tornara um super astro. Desde cedo era maltratado pelo Pai em exaustivas horas de trabalho em nome do show biz e privado de sua infância algo que o traumatizou por toda sua vida, fatos que passou despercebido ao mundo no geral, mas que no futuro ficaram evidentes as marcas dessas cobranças.
E vivi anos, observando esse artista sem muita atenção. É tão fácil desprezar alguém, ideologicamente... Quando vemos alguém que se destaca na vida e vira um ícone jamais paramos para pensar: ele tem uma vida como um ser humano normal? E o tempo passou.
Depois da euforia inicial dos anos 80, vi que aquela criança que se tornara gênio dançarino, coreógrafo, músico e cantor considerado um Midas, começou a mudar o seu estilo de vida prenunciando as nuvens negras que o acompanhou até os fins dos seus dias.
Depois, Michael ficou doente, há muitos anos. E eu e muitos olhávamos cruelmente seus tremores, suas manchas e manias crescentes e, sem compaixão nenhuma, pensava que o artista era maluco, esquisito entre tantos rótulos e riamos, como verdadeiros juízes.
Até que, nos últimos dias, Michael moribundo, falido e sem querer nem ter com quem dividir seus verdadeiros problemas adiava os shows (necessários para quitar suas enormes dividas) e se recolhia em sua mansão alugada (verdadeiro presídio).
Esse é um retrato de como o grande artista terminou os seus dias este fato é um marco, um símbolo forte. Parece um prenúncio do seu Juízo Final, uma moldura do Apocalipse, a cara de nossa época. É aterrorizante ver o despreparo daquele homem que não cresceu produto de um meio e por que não dizer de nossa própria geração. Naquele momento, subitamente, entendi alguma coisa maior que sempre me escapara: a queda daquele astro que fez homens ficarem incrédulos e chorar feito criança, vários rostos infantis em prantos! A morte de Jackson nos fez voltar e ver: ali estava o menino pobre e negro, ali estava o símbolo de várias pessoas que transferiam os seus sonhos e desejos de sucesso, os atacados pela fome, ali estava sua imensa solidão igual à nossa. Então, ele morreu. E, vendo os milhões de fãs chorando pelo mundo, vendo as ruas cheias, entendi de repente sua obra, sua imensa importância. Vendo as reportagens da TV, montando sua vida inteira, seus milhões de quilômetros viajados, da África ao Japão passando pelas favelas do Brasil, entenderam o astro e o seu legado. Emocionado, senti minha intensíssima solidão. Eu não estava fora daqueles milhares de fãs, eu tinha a velha nostalgia esfacelada, uma multidão para dividir, eu fazia parte dos inúmeros filhos órfãos do grande astro, eu era um órfão não só de sua música e dança, mas do meu próprio passado. Aí, tremi, com olhos cheios d'água. Não vi Michael Joseph Jackson pessoalmente, nem em seu sepultamento, mas vi o lamento e a reverência a ele feita em muitos lugares do mundo, inclusive, onde ele nunca passou
É o seu legado que devemos agora destacar. Michael cumpriu seu destino de artista que além de sua visão revolucionária mudou a forma de vermos o mundo da música influenciando várias gerações de artista no mundo todo.
Sei que como homem aquele ser humano nunca deixou de ser aquela criança sem pai nem mãe, rica e falida, adotada pela vida irreal e cruel, sozinho, condenado aos rótulos de esquisito e maluco, vi que se há alguma coisa de que precisamos hoje é de humanidade, de um pensamento transcendental, de uma espiritualidade perdida. Michael Jackson na verdade foi o melhor no que fez e o pior que o homem pode se tornar com o abandono.
Wagner Cabral