A estrela morta

Trancada numa casa abandonada,apenas esperando o sopro da morte vir me buscar. Já passei muito tempo assim,talvez meses,ou anos. Não sei. Ainda não sei também o motivo.Pelo menos não ao certo.

Tenho um amigo que sempre me traz comida,bebida,remédios,cobertores,discos,livros e outros objetos. Mas lhe pedi para nunca me contar a data. Nunca me trazer nada atual. Acho que ele também pagava as contas pela quase nula energia que eu utilizava. Era por isso tudo que não fazia a mínima idéia da data.

Estar nessa casa me fazia sentir algo,mesmo negando a existência do meu ser. Talvez estivesse desperdiçando algum tempo da minha vida aqui. Mas eu era lenda,de qualquer modo.

Um dia meu amigo me contou sobre as crianças do bairro. Me disse que eles achavam que eu era um fantasma. Eu era a estrela morta. Isso porque antes dessa casa ser abandonada,morava aqui uma cantora de jazz. Pois bem.

Meu único companheiro queria que eu saísse daqui,mas eu sempre lhe dizia que sabia o que estava fazendo. Então ele não insistia mais. Além do mais,eu não ficava aqui o tempo todo parada. Eu gostava de limpar as coisas as vezes,gostava de pintar,cantar,ouvir discos de jazz...por isso eles diziam que eu era o fantasma. Também gostava de observar as pessoas pelas frestas das janelas. Esporadicamente algumas crianças se aventuravam a me visitar a noite,mas eu apenas aparecia com o candelabro na janela e elas saiam correndo. Eu caia em riso.

Certa vez,não foi uma dessas crianças que me perturbou. Era uma noite bem fria,eu tentava me aquecer mas não conseguia. Apenas ignorei o frio,como sempre fazia em ocasiões como essa. Então ouvi algum movimento na minha cozinha. Pensei que não podia ser um ladrão,nem uma criança,pois era madrugada. Me levantei,com algumas velas e fui ver. Parecia ser um homem. Ele me viu e começou a me seguir,mas eu comecei a tentar fugir. Então eu decidi parar e o surpreendi.

-O que você quer?-perguntei. Ele deu um pulo e empalideceu.

-Cristo!-ele disse.

-O que foi?-insisti.

Ele se aproximou,e eu afastei.

-Você mora aqui?-ele perguntou.

-Lógico.

-Há quanto tempo?

-Não sei. Quantos anos eu pareço ter?-perguntei.

-Vinte e quatro.

-Deve ser isso.-dei de ombros.-O que você queria,afinal?

-Saber quem era a Estrela Morta.

-Agora você já sabe,sou eu. Não sou um fantasma,estou viva.

Sem saber o que fazer,fui para a cozinha,esperando que ele me seguisse. Lhe servi um pouco de vinho,torcendo para que fosse isso que um anfitrião devesse fazer. Bebemos calados,à mesa da sala de jantar.

-Como se chama?-ele perguntou.Preferi não responder.

Passou algum tempo,eu estive pensando nos últimos minutos. Senti que era hora. Hora de sair. Hora de deixar. Hora de mostrar a todos quem era a tão esperada estrela. O rapaz me observava.

-Sabe,você é mais bonita do que eu imaginava.-ele disse.

Mais do que nunca,eu sabia que era hora.Adeus,casa. Adeus para o lugar que por tantos anos me fez lenda e eterna.

Lizzy Werkema