Lembro-me hoje de uma Páscoa que passei em casa de minha avó paterna, a carinhosa e encantadora Dona Benvinda . Mulher de fibra, de muita luta, muitas perdas, e de muito amor.Quando não estava enlouquecida , esclerosada, como justificava o médico de família, Dr. Oswaldo, que vinha sempre visitá-la. Naquele tempo os médicos visitavam nossas casas. Conhecia a família toda. Eram uma espécie de anjo—bons tempos! Bem, voltando à minha Páscoa, morávamos no sítio, a quinze quilômetros da cidade, barro puro. Se chovia, nem pensar em vir pra casa da vovó, nosso ninho predileto, onde tínhamos seus quitutes – tortas, bolinhos de bacalhau, sequilhos de coco, doces de todas as frutas, mingau de fubá—hummmm que delícia, e , especialmente, o seu carinho incondicional de avó. Havia também, na parede da casa de "material" alvenaria -- linda, cheia de quartos ensolarados, com quintal amplo, onde encontrávamos de tudo um pouco: parreiras de uva, ameixeiras floridas, pêssegos, figos, mangas coquinho -- um relógio antigo, de carrilhão, que soava a cada quinze minutos. Dormir, nem pensar! Mas, o seu badalar era maravilhoso. Sinto saudades ! Naquela Páscoa não chovera e íamos passar lá com vovó Benvinda, Vovô Francisco,(Nhonhô)Tia Nonó – doceira de bom gosto, e os primos vindos de São Paulo e outras cidades. Meus pais eram pobres, nem sempre tinham dinheiro para comprar ovos de chocolate para nós. Vendiam ovos caipiras para um tal Genésio, para juntar o dinheirinho para estas ocasiões. E, que ingratidão : na quaresma as galinhas não botavam! Sorte que o preço então subia virtiginosamente. O fato é que mamãe fazia das tripas o coração para não ficarmos sem um ovinho. Pediu que fizéssemos um ninho com flores do jardim e grama do quintal, bem bonito, porque o coelhinho viria nos visitar naquela noite. Meu Deus, nem dormimos! Passamos por um cochilo. Nem vimos quando o coelho veio, mas, acordamos ainda de madrugada e lá estavam os ovos: brilhantes, belos, apetitosos, lembro-me até da cor, era de um rosa-maravilha, e a marca, claro, da Lacta--- naquela época ela já estava instalada aqui na terra de ninguém! Bom, depois da alegria,cansados, deitamos, bem agarradinhos, apertadinhos com o delicioso ovo...como se fôssemos galinhas que estivessem chocando seus ovos, até o sol aparecer na vidraça e o chocolate cheirar mais do que o normal...todo derretido pelo calor de nossos corpos!
Benvinda Palma