Eu não sou "boy" sou motorista da Gurgel!

Em 1972, recebia eu da auto Escola, a então sonhada C.N.H. – Carteira Nacional de Habilitação, apesar de que já tinha certa experiência em dirigir veículos antigos, tais como: Gordini; Dalphine; DKW e o famoso Chevrolet 51, vivia praticando balizas nos campos de futebol varzeano existentes pelo bairro.

Com a carta novinha em folha, peguei emprestado do meu o Chevrolet 51, de cor preta, fazíamos uma vaquinha entre os 6 colegas e lá vamos nós para a represa Bilings, região de Diadema-SP.

Pilotando o velho carrão me sentia como se fosse o político famoso da época dos anos de 1950, o Sr. Adhemar de Barros, que foi prefeito e governador do estado de São Paulo.

O então candidato Adhemar esteve fazendo um comício na Avenida Carioca bem em frente do “Bar do Spolon”, após encerrar o comício sua caravana seguia pela Rua Lício de Miranda, muitas pessoas acompanhavam correndo do lado e atrás, enfim próximo do veículo com objetivo de cumprimentá-lo, e consegui o meu intento.

O veículo que transportava o político famoso era um Chevrolet 51, de cor preta, uma coisa puxa outra, mas eu quero falar é outra coisa, falar de profissões.

Após encerrar o curso de compositor manual no Senai - Artes Gráficas (Theobaldo de Nigris - Cambuci), meu pai me questionou dizendo. Eu sei que você gosta de trabalhar no ramo gráfico, mas aproveita a sua juventude e aprenda outra profissão. Enfim acatei tal sugestão, naquele momento optei lhe dizendo vou trabalhar de motorista, pois assim vou conhecer o Brasil inteiro.

Na época trabalhava numa editora de revista, livros e afins, até que ganhava razoavelmente, mas queria ganhar mais e como não fui atendido, pedi a conta mesmo gostando do que fazia.

Meses depois de sair da editora consegui um emprego de motorista na Gurgel Veículos Ltda, Avenida do Cursino – Jardim da Saúde – SP. Exercendo a nova profissão me sentia livre, rodava ora com uma Kombi tipo camionete ora com um Buggy, aí me sentia um boy. Rodava pela capital de São Paulo, de norte a sul leste oeste, isto de segunda a sexta-feira, coletando peças automotivas, de vez em quando viajava pra Rio Claro-SP.

(Buggy, utilitário montado sobre plataforma do sedan, Volkswagen de motor traseiro e encarroçado em F.R.P. – Fiberglass Reinforced Plastic).

Os amigos me viam com o buggy também diziam que eu era boy, talvez porque antes de entrar na referida empresa eu tinha um Aero-Willys já bem velhinho. Quem sabe se compara ser boy com os atuais mauricinhos?

Em 1975, a montadora Gurgel Veículos Ltda., se destacava no mercado nacional e também no internacional, na produção de veículos opcionais, sendo que muitos veículos, jipinhos tipo militar foram exportados para alguns países da África.

Novo projeto de veículo a ser construído, fui designado para ir até a “Trorion” retirar 15 ou 20 quilos de espuma rígida para modelar um protótipo. Adentrei nas dependências da referida empresa fui atendido rapidamente e em seguida tive ajeitar o produto em cima do teto, amarrei com uma corda, assim feito rumei para Avenida do Cursino.

Isso foi no mês de dezembro de 1975, mais ou umas 16 horas, garoava muito na região, e ao passar em frente do cemitério de Piraporinha - S. Bernardo do Campo, no cruzamento, acabei colidindo com um ônibus de passageiros, ônibus de transporte urbano.

Na seqüência da colisão, o ônibus bateu num poste de iluminação publica quase que entrou em um bar que ficava na esquina, daí em razão de ter um transformador no poste de alta-tensão, acho que de 6.000 wolts? Iniciou uma seqüência de explosões multicoloridas, todo bairro ficou sem energia elétrica, foi um Deus nos acuda. No momento da colisão fiquei atordoado, perdi os sentidos, achei que tinha ido pro além, segundos depois, estava tendo um acesso de riso. Não sei dizer, porque aconteceu esse acesso de riso, talvez em razão de estar vivinho da silva como diz um ditado popular. Bati de frente na roda dianteira (lado esquerdo) e quando abri os olhos estava dentro do buggy, na roda traseira, devo ter rodopiado com o veículo no paralelepípedo molhado.

Aglomeração de pessoas próximo do acidente, alguém chamou a polícia e logo chegou uma viatura-fusca com dois soldados da Força Publica, atual PM, para fazer o BO.

Nesse ínterim o guarda do cemitério se prontificou dizendo que podia deixar o buggy estacionado em frente que ele tomava conta, mas falando no meu ouvido, você me paga 50 paus, tudo bem. O guarda do cemitério também achava que eu era boy por estar pilotando o buggy da Gurgel.

Já eram 23 horas e lá vamos nós na viatura-fusquinha para o 1.° DP de S. Bernardo do Campo. O motorista do ônibus do lado esquerdo e eu do lado direito, uns quarteirões a frente o motorista de ônibus pegou no sono, eu permaneci acordado de Piraporinha até o 1.o DP, a curiosidade é que, os soldados entoavam uma música, até que parecia uma boa dupla sertaneja, eles iam cantando Índia teus cabelos...

Chegando no DP, um dos soldados com a prancheta na mão pergunta para o parceiro, como devo escrever? Colidiu ou colidiram-se. Enfim ambos tinham duvidas como elaborar o BO, percebi pelo rubor de suas faces que eles tinham cometido uma gafe. Quando ouvi tal pergunta, ironizei sem querer querendo, e disse. “A língua portuguesa já foi usada como código de guerra, qualquer deslize ninguém vai se importar com isso”.

O soldado não gostou da ironia e me lascou na cara dizendo. O seu (meu) endereço é frio, não existe, você é um boy. Respondi calmamente que não era boy, era motorista da Gurgel. Nisso entra no dialogo um agente civil (investigador) existe sim. Eu sou vizinho do rapaz, os praças ficaram mais perdidos que “cego em tiroteio”. Fui chegar em casa a 1 hora da madrugada.

No outro dia fui retirar o buggy que deixei estacionado em frente do cemitério, quem estava no posto era outra pessoa, daí, logo deduzi, levaram tudo o que podiam do veículo, e assim se confirmou quando abri a porta do buggy, levaram o estepe, macaco, triangulo e outras ferramentas. Voltei com o veiculo com a frente do capot arrebentada, roda meio torta, mas deu pra chegar à empresa.

Meses depois vi um funcionário pilotando o protótipo, achei estranho, motor sem ruído, escapamento sem fumaça, era um veículo movido à bateria.

“Os buggy’s montados pela Gurgel Veículos Ltda., tinha tudo pra dar certo, mas fazer o que, era um produto brasileiro, quem sabe alguém boicotou o projeto”.

Tangerynus
Enviado por Tangerynus em 03/04/2010
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