A PÁSCOA

Os dias que antecediam a páscoa eram aguardados com alegria e ansiedade, pois embora não houvesse recursos para grandes presentes tínhamos a certeza de que o modesto ninho de páscoa estaria escondido pela casa, ou até mesmo no quintal, conforme a criatividade amorosa de mamãe.

Comemorávamos esta data especial com muito carinho e respeito ao sacrifício de Jesus Cristo, que sabíamos, era o Cordeiro de Deus que morrera para salvar a humanidade. Contudo, quanto mais aproximava-se a páscoa, mais eufóricos e sonhadores ficávamos, pois era impossível não pensar nas guloseimas que sempre ganhávamos nesta ocasião. Uns tres dias antes da data tão sonhada, mamãe mandava que deitássemos cedo, mas não resistindo à curiosidade, espiávamos o que ela fazia na cozinha. Nossos olhos brilhavam diante daquela cena: em cima da mesa várias cascas de ovos, limpas e tingidas de várias cores aguardavam o recheio que ela preparava com amendoins, açúcar e chocolate. Depois de rechear as cascas, mamãe colava uma proteção de papel de seda colorido para não amolecer o recheio. Íamos dormir felizes e ansiosos para que chegasse logo o domingo. Na noite seguinte, lá estava mamãe, novamente rodeada por balas de goma, pirulitos, bombons, ovos de açúcar e uns raros coelhinhos de chocolate. E lá ficávamos, a fitar nosso tesouro.

A confecção das cestas era um detalhe à parte: mamãe picotava papel colorido e forrava uma caixa de papelão e para decorá-la, usava franjas de papel de seda, dando aquele toque que completava a magia daqueles momentos. Os ninhos de páscoa tinham um significado especial, e não era apenas pelas guloseimas que ganhávamos, mas sim pelo amor e dedicação que mamãe impunha naquela tarefa. Mesmo depois de um longo dia de trabalho, desprezava o cansaço e, madrugadas à fora, empenhava-se naquilo que sabia ser motivo de grande alegria para nós.

Mas nem tudo era riso e na sexta-feira santa, seguíamos os rituais religiosos: Não podíamos rir, comer carne ou derivados, ouvir música, nem mesmo realizar as tarefas domésticas, como varrer a casa, por exemplo.

Em compensação, não podiam castigar as crianças. Mas também, se não podíamos fazer nada mesmo, não havia motivo para castigos. E depois, sabíamos que se fizéssemos algo errado, no sábado de aleluia os castigos seriam dobrados!

Quando chegava o domingo, mal conseguíamos dormir e aos primeiros raios de sol que invadiam as frestas da casa, o coração disparava diante da expectativa da "caça ao ninho". Seguíamos as pegadas brancas deixadas pelo "coelhinho", iniciando a algazarra, a correria e a alegria, quando finalmente, encontrávamos a cesta de páscoa. Mamãe fazia tudo aquilo com tanto amor e dedicação, que a nossa felicidade rebrilhava em seu rosto, que para mim era sempre um rosto de menina. São sempre doces estas lembranças e embora hoje em dia muitos não valorizem estes gestos amorosos, persisto, e sei que meus filhos continuarão mantendo, na medida do possível, este sentimento de renovação e encantamento, os quais envolvem as festividades da páscoa. Enquanto houver corações habitados por amor, carinho e dedicação, tal qual o de mamãe, que nos possibilitou uma infância das mais felizes com a qual uma criança pode sonhar, o verdadeiro sentido da Páscoa permanecerá, provando que nenhum sacrifício motivado pelo verdadeiro amor, é em vão.

Helena da Rosa

02.04.2010/07.03.2013