Eu sou Zaratustra

Fodam-se todos. Essa não é a vida real. Eu to cansado, to angustiado, to de saco cheio de rostos alegres e falsos, de atitudes desprezivelmente humanas, to cansado de joguinhos, charmes e beicinhos. Já não tenho mais paciência pra isso. Foda-se a hipocrisia do mundo, a concepção de felicidade baseada em matéria e não em experiência. Foda-se essa sociedade falida que te impõem um modelo de nascer, crescer, estudar, arranjar um bom emprego, ganhar dinheiro, trabalhar mais, ganhar mais dinheiro, e chegar num ponto da vida onde aí poderá usufruir o dinheiro que ganhou, mas que não vai poder faze-lo porque tem milhões de problemas de saúde pra tratar que a busca incessante pelo vil metal fizeram com que tu adoecesse. Foda-se tudo, foda-se o que pensam de mim, foda-se se acham que eu sou louco. Eu não quero viver agora para deixar um legado. Eu não quero ter que me matar 25 anos trabalhando 8 horas por dia para ter um carro bom, uma casa boa, um sustento tranquilo, uma vidinha e uma família de propaganda de margarina. Foda-se isso, eu quero é me sentir vivo. Eu não preciso de grana, eu não vivo pelo dinheiro, eu não acordo de manhã pensando como fazer para chegar de noite com mais grana na conta do que eu tinha quando abri os olhos. Não é uma preocupação. Não agora. A simples idéia de ter 22 anos, já estar formado na faculdade, estar prestes a entrar pro mercado de trabalho, e ter olhado pra trás e saber que foram poucos, talvez pouquíssimos dias em que eu fui dormir com a sensação de ser grato por estar vivo por ter vivido aquele dia em especial. Por que não fazer isso sempre? Pra viver a grande maioria desses dias não foi preciso grana. Não é o dinheiro que me move, eu não preciso viver no luxo pra apreciar a vida. Eu quero é viver pobre, onde se dá valor ao que se tem. Onde o teu sustento é tu quem faz, e se tu quer lavar prato para poder dormir em algum canto, ou trabalhar de manhã para poder jantar, ótimo, eu te invejo. Isso te dá vivência, isso te dá experiência, isso é viver. Isso é a vida. Se Warren Buffet bater as botas hoje, ele vai chegar pra prestar contas, e as histórias que ele irá contar serão de quão foda ele foi, de como ele fez pra ganhar aquela grana toda, e blábláblá. Mas se um mendigo morrer de frio e fome numa sarjeta suja, a história de vida dele certamente será mais rica que a do milionário. O legado de um medigo pra mim vale mais que o legado de um magnata. Apesar do mendigo não deixar propriamente um legado, pois ele viveu do modo que ele quis. Tornou-se um anônimo para os outros. Viva para si, morra para os outros. Ou torne-se um magnata, passe 60 anos da tua vida trabalhando, acumulando dinheiro, e no final, todos ficarão felizes com a tua morte, pois tu deixarás um graaaande legado de enormes riquezas que tu mesmo não pode aproveitar. Fato, o mundo deveria ser dos egoístas. A compaixão é a pior das virtudes dos homens. Tu quer dar uma vida melhor pra quem te cerca? Ótimo, tu estás criando um câncer. Pense em ti, faça com que a tua vida seja melhor, esse é o maior dos ensinamentos que se pode dar a uma criança, esse é o mundo real, essa é a vida real. Teu filho adolescente fez 18 anos e tu quer dar um carro pra ele? Ótimo, tu estás criando um monstro capitalista, onde ele irá se vangloriar e se exibir perante aqueles que não tem a possibilidade de ter um carro. A maior lição que se pode dar a alguém é justamente essa: mostrar o que é a vida real. Tu tem o carro do ano, casa na praia, na serra e na puta que o pariu, tem 4 milhões de dólares no banco, é dono de uma empresa multimilionária, tem uma família feliz? Bom pra ti, to cagando pra tudo isso. Tu é um ser humano assim como eu, tem os mesmos instintos, as mesmas necessidades. A diferença é que tu vai te vangloriar de ter acordado cada vez mais rico, com mais grana, e eu vou me vangloriar de que pelo menos eu percebi a beleza do nascer do sol. O que vale mais, ao fim de tudo? Tenho planos pra trinta anos à frente, mas um caminhão me achou na esquina e eu morri atropelado ali, com todos os sonhos e esperanças guardados no bolso. De que valeu? De que valeu todo o estudo, dedicação, tudo, para tornar-se o homem médio, de conduta irrepreensível e de vidinha mediana, pacata, e previdente? De que valeu? Em nada, porque a vida não é controlada pela gente. Nós somos uma marionete de uma entidade superior. Não nos cabe tentar controlar o incontrolável, portanto devemos aproveitar o que está em nosso controle. O futuro é incontrolável. A vida é incontrolável. Viva. Essa é a vida real. Fodam-se todos, eu não sou um homem médio. Eu sou Zaratustra.