Minha Havana deu filhote…
Itamaury Teles
Nunca uma crônica minha repercutiu tanto junto aos leitores como a que relatei o fim a que deram na garrafa de Havana que eu havia ganhado do seu fabricante, o lendário Anísio Santiago, de Salinas.
Pude constatar que o mineiro não é solidário apenas no câncer – como afirmava categoricamente o escritor Oto Lara Resende -, mas também quando o assunto gira em torno de uma garrafa de cachaça. Em especial quando algo inesperado acontece com o conteúdo precioso desses recipientes de vidro...
Para serem solidários com o meu infortúnio – já que meu filho desdobrou os 600 ml de Havana em alguns litros da mais cara caipirinha de que se tem notícia -, contaram-me várias estórias parecidas, talvez para consolarem-me com um “você não estava só”...
Uma leitora até falou-me que seu casamento teve um ponto final quando resolveu fazer uso de duas garrafas de Havana que seu marido guardava. Como não gostava que ele bebesse, apanhou as garrafas e misturou seu precioso líquido com dois litros de xarope de groselha. Fez uma quantidade enorme de ponche e distribuiu numa favela da cidade, para deleite dos bebuns. Depois disso, seu marido nunca mais a encarou e a excomungou para todos os séculos seculorum...
Também a mãe dessa leitora fez algo parecido com a garrafa de Havana que seu pai ganhara de um cliente. Aproveitando-se de uma viagem a serviço do marido, sua mãe foi ao quintal, colheu um quilo de pimenta malagueta e fez a mais cara conserva que alguém já provou. Aliás, só provaram uma vez. Quando soube o fim a que sua mulher havia dado à sua Havana, o “fiscal de rendas” pegou a garrafa de conservas pelo gargalo e o atirou no primeiro muro, quebrando-a em mil pedaços...
No Café Galo, um amigo, recém-separado da mulher, contou-me que o fim do seu casamento teve início justamente na semana seguinte à lua-de-mel. Sua mulher convocou as amigas para uma farra na nova residência. Entre uma brincadeira e outra, resolveram fazer uma “batida” de limão. Como nada conheciam de cachaça, fizeram uso da que encontraram por perto: justamente sua garrafa de Havana...
O escritor Dário Cotrim até se condoeu com a minha situação de ex-proprietário de uma garrafa de Havana. “O que nós não fazemos pelos nossos filhos, hem? Somos capazes de achar graça quando eles usam e abusam da melhor “pinga” do Brasil.” Disse-me que tinha uma garrafa e pensou em dar-me de presente, “mas meu filho pediu primeiro” - lamentou.
Mas o melhor e-mail que recebi veio de Salinas, sob o título “Achei sua Havana”, escrito por um certo Deda, que se apresentava como contador da Cachaça Havana. Afirmava ter lido o meu artigo e que o mostrara ao filho do Sr. Anísio Santiago, Sr. Osvaldo, que hoje é sócio e administrador da empresa. Ele queria o meu endereço para repor o “precioso líquido”.
Em princípio, achei que fosse brincadeira, mas logo confirmei, pelo telefone fornecido, que se tratava de um contato oficial.
Não tive dúvidas. Mandei meu endereço e, poucos dias depois, chegou a preciosa encomenda, trazida por um taxista salinense: um embrulho contendo dois cilindros de papelão. Abri e, para minha surpresa, lá estavam: uma garrafa de Havana e uma de Anísio Santiago. A minha Havana deu filhote...
Agora, para garantir a sua integridade, limão e açúcar passam longe da minha casa...