Vida Virtual

Fala-se muito que a chamada vida virtual não se pode comparar com a vida “real”, por faltar o contato físico entre as pessoas e que “o olho no olho” é imprescindível em nossas vidas. Os avanços da tecnologia vão sempre trazer essas perplexidades relacionadas aos novos valores e provocando, inclusive, mudanças éticas. Estou tendo estas reflexões a propósito deste fenômeno novo que é o convívio de pessoas através de sites de relacionamento, muitas vezes agrupando gente em torno de um tema específico. Trocando em miúdos: o site, ou sítio, como queiram, do recanto das letras, por exemplo, reúne uma diversidade enorme de pessoas, que se sentem ligadas pela palavra e esse amor à escrita as leva à produção de contos, crônicas, poesias, nas suas infinitas formas, redações, diários, estudos, pensamentos, e mesmo simples frases. Nesta produção literária diária dos freqüentadores do site, ocorre um segundo fenômeno, a meu ver, notável, que é a amizade virtual que brota espontaneamente, em razão dos comentários e análises que os participantes acabam fazendo, quando lêem o que os outros estão escrevendo. E é nesse ponto que quero deixar na roda viva dos meus afins os meus sentimentos, que são tão genuínos quanto os da vida “real”. Emoções de alegria, de amizade sincera, de exaltação, de susto, de medo, de respeito, de apreensão, de surpresa e até de desagrado. São emoções reais e é como se estivéssemos todos reunidos perto de uma lareira aconchegante, exatamente como faziam, na noite dos tempos, os homens primitivos em suas cavernas, mostrando ao outro partes de seu ser, trocando confidências, relatos de histórias, “ensinando e aprendendo”, saindo, enfim, de suas solidões e buscando a vida, que triunfante, seguiu sempre adiante. Quando uma das minhas amigas conta que se reuniu com a sua turma e passou a noite cantando, o pano de fundo que me vem à cabeça é a de um grande terreiro, ao ar livre, em noite de lua cheia, com o céu salpicado de estrelas, e chego até a ouvir “luar do sertão”. Não é, portanto, tão necessário que haja o contato físico, para quem tem uma imaginação de primeira ordem. Não tenho a menor dúvida que isso também é vida real e o avanço tecnológico simplesmente ampliou este tipo de vida. Real e virtual existem e se completam. O amigo virtual também é de carne e osso. Todas sabem que há presenças bem ausentes, enquanto há ausências bem presentes, assim é o ser humano, incompleto e ainda em formação, repleto de contradições e paradoxos. O próprio real ainda suscita dúvidas aos filósofos, que não raro, em suas buscas, encontram o surreal, o irreal, fugindo-lhes sempre o conceito verdadeiro da vida. Diante disso, sinto o virtual tão ou mais concreto que o próprio real. Por quê, não ? Mas deixemos esse jogo de palavras e essa vã filosofia. Apressemo-nos a viver a vida virtual como uma chance a mais de colocar nossa humanidade afirmativamente e, como diz a música, e isso é fundamental, sem medo de ser feliz!