A ANGUSTIA

A N G U S T I A

O dia chuvoso cheios de nuvens escuras chegava ao seu término, estava no trem superlotado me sentindo muito desconfortável, não conseguia me mover um centímetro, nos semblantes das pessoas próximas, vi tristeza cansaço e serenidade, e pensei ‘hoje este retorno para casa nesta hora do rush, será verdadeira agonia’.

O vozerio dos passageiros me impediam de concentrar em meus problemas imediatos, falavam de futebol, política, religião, fofocas, novelas, a maioria demonstravam que estavam habituados com este transporte desumano, e pensei novamente ‘viajo todos os dias neste subúrbio lotado, mas nunca irei me acostumar’

Uma voz masculina provavelmente de Sr idoso, me chamou atenção. Ele dizia;_ "Eu não me conformo com esta morte tão prematura... minha menina tinha tanto ainda a viver... realizar seus sonhos... se tornar bailarina.. não me conformo ...não me conformo..."-

Tentei girar meu corpo em direção aquele som, mas foi impossível, nem com o balanço da composição consegui. O homem começou a soluçar suavemente, outra voz começou a falar;

_" Ah! Meu querido é isso que devemos fazer, chorar, assim quem sabe a dor diminui e esta espécie de angustia vai embora " -

Notei ser mulher talvez idosa falando, ele parou de soluçar e retrucou; _" Espécie de angustia? Por acaso existem angustias diferentes? Para mim esta palavra só significa sofrimentos" - Percebi a sabedoria da mulher, que procurava criar polemica o levando a esquecer um pouco a sua dor.

Neste momento concentrei toda a atenção neste diálogo, o vozerio ficou bem distante, o trem se movia lentamente pois as chuvas caiam em abundancia. A mulher disse; _" Claro meu velho, existem sofrimentos causados por perda de emprego, por doenças, por injustiças recebidas, as privações, por falta de dinheiro, a miséria -

Ele a interrompeu falando: _ " tudo isso é fácil de suportar, o que estou dizendo são as dores da alma, sinto como um pedaço da minha vida foi tirado.. . a morte é terrível ela não pede licença, chega leva quem amamos, sem se importar com quem fica. É pior que o ladrão que ataca de surpresa, pois do ladrão podemos recuperar o que foi roubado, a morte não dá segundas chances, depois que passa só fica este doloroso vazio." - voltou a soluçar timidamente.

Neste ínterim todas as pessoas pareciam fazer silêncio para escutar o casal conversando.

Ouvi a mulher falar calmamente._" A vida é assim, este dia frio e chuvoso nos deixa deprimidos, mas amanhã virá o sol com muita claridade, nos trazendo alegria e esperança.. e veja; se continuarmos assim só chorando, igual a este dia triste, jamais vamos ver o sol luminoso cheio de alegrias novamente.." -

Ela demonstrando estar emocionada comentou; _ " Só a certeza que nossa querida menina... o nosso anjo... está nas mãos de Deus .. alivia a nossa alma..."

O Sr parou de soluçar, adquiriu confiança na voz e disse: _Verdade, há diversos tipos de angustia, esta que estamos sentindo não tem concerto, aprenderemos a suportá-la, contudo há outras, que são passageiras, assim como vêem, vão, como você comentou. São os problemas comuns da nossa sociedade, e há angustias da alma também de forma passageira, como por exemplo, as separações, as ingratidões, toda estas dores podemos superar. -

Depois destas palavras houve silêncio, o trem voltou a velocidade normal, se balançando parou na primeira estação.

Para meu desespero, ninguém desceu, outras pessoas entraram empurrando a todos, fiquei mais espremido ainda, mas mesmo assim procurei manter atenção na conversa do homem, que após a composição partir continuou falando;

_ Olha minha velha, existe também a angustia boa... lembra daquele médico amigo nosso, o Doutor Luiz? ...Lembra quando ele disse que em tudo que acontece de ruim, há algo bom...? lembra quando nos falou.? ' A alma quando se sente angustiada se aproxima de Deus, olha para dentro de si, vê o que pode estar errado, se torna generosa, tem compaixão, fica solidaria, se humaniza. -

Nada mais consegui ouvir. O trem começou a balançar violentamente, chegou lentamente a estação. O corre corre das pessoas me impediram de identificar o casal, embora os procurasse de todas as maneiras.

Fiquei com o gosto amargo da decepção, gostaria de conhecê-los , saber seus nomes, como viviam, e me solidarizar com sua dor.

Resolvi seguir a pé até a minha residência, sem me importar com a fina garoa, evitei o ônibus, meia hora de caminhada, me permitiu refletir em tudo que ouvira.

Duas pessoas comuns do povo me passaram sem saber profundo ensinamento.

Jamais pensei em ver valor nas angustias, mas entendi que a função delas é abrir nossa alma, nos impulsionando em direção ao criador.

Mário Silva
Enviado por Mário Silva em 27/03/2010
Reeditado em 23/10/2010
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