O pé(zão) e a mão(zona)...

Pedrinho, garotinho mirrado e pouco comunicativo, jamais usava chinelo de dedo. Sempre estava de tênis e alerta. Quando chamavam ele pra ir pruma piscina, no clube que ficava próximo à sua casa, ia com certa resistência, mas adorava água, então entrava de tênis mesmo. Durante uns cinco segundos ficava tudo uma maravilha, até o homem encarregado da limpeza aparecer. Era sempre a mesma história; Pedrinho não se cansava de tentar, e o homem, de barrá-lo.

Na escola era motivo de zoação. Sempre gritavam "Chulezão" quando queriam falar com ele, mesmo isso não sendo verdade. Pedrinho era extremamente asseado, principalmente com seu tênis, que tanto amava e necessitava.

A causa-motora dessa sua fixação pelo tênis não estava no próprio, este não tinha nada de mais, era inclusive um exemplar repetido e sem muita frescura de cor e amortecedor de impacto. A razão era, portanto, exterior ao próprio objeto de tanta perseguição por parte de amigos e primos. É que seu pé era muito, mas muito grande, tinha um dedão que era estranhamente avermelhado, parecendo um morango silvestre. Já o dedinho, por contraste, era miúdo e preto, parecia um feijão.

Pedrinho seguiu de chacota e de tênis por um bom tempo, até que a Luíza apareceu. Ela era a menina mais linda que a garotada já vira, sempre que aparecia levava consigo a atenção e os olhares, masculinos e femininos. As garotas se mordiam de inveja, reclamavam pelos corredores a ingratidão dos meninos, que davam todos os presenets para essa que outrora nem sequer existia, pra essa estranha. De fato Luíza tinha uma peculiaridade, à moda do Pedrinho, ela tinha a mão um pouco grande demais. Isso não parecia ser um grande problema, já que tinha um rosto que parecia ter sido esculpido pela mão do próprio Apólo. Suas formas eram perfeitamente simétricas e o sorriso encantador. A voz suave sempre que falava demonstrava certa sabedoria das coisas. Ela, ao contrário de algumas meninas, tinha muito assunto pra se prolongar uma conversa divertida e inteligente. Luíza passou a usar as mãos sempre nos bolsos, já que ficou logo conhecida por sua peculiaridade. Quando não tinha saída apelava pras luvas, mesmo que isso chamasse ainda mais a atenção. Ela queria, com isso, dizer que as luvas é que faziam suas mãos parecerem maiores.

O encontro dos dois, Pedrinho e Luíza, aconteceu num sábado à tarde, em uma aula de natação na escola. Luíza estava de biquini e luvas; Pedrinho, de bermuda e tênis. Eles se olharam rapidamente, sem muito interesse (exceto, claro, por pelo lado de Pedrinho) e seguiram mergulhando. Logo que saíram da piscina Perinho foi conversar com ela, pra conhecê-la e tentar promover a si mesmo.

-Oi, meu nome é Pedrinho. Você é nova na escola, então quis conhecer você...

-Ah tah, você é o Pedrinho, ou o "Chulezão". Eu não tinha falado com você mas já me falaram de você pra mim. Meu nome é Luíza, vim de uma cidade próxima.

-Ah sim, "Chulezão" é um dos meus apelidos, no começo eu não gostava mas hoje até me acostumei. Mas e você, por que usar a luva?

-Ah, é uma lonha história. Eu não vou te chamar de Chulezão, isso soaria um pouco estranho.

-Certo, me sinto bem em que haja alguém que não use esse apelido...Você quer tomar um sorvete ou um refri?

-Claro, estou com sede e quero descansar um pouco.

Então saíram prum passeio. luíza com um sorvete nas mãos, que mais parecia uma miniatura do que um sorvete real. Pedrinho, agora com seu ego maior que os próprios pés, passava na frente dos outros garotos e erguia o queixo. Havia, enfim, conseguido algo com seus pés de menino-gigante. A partir desse dia Pedrinho não foi mais chamado de "Chulezão", já que perdera a graça, porque Luíza chamava ele carinhosamente de "Chulezinho". Para a primeira visita que fez à casa de Luíza, inclusive comprou tênis novos e grandes; tênis espaçosos. E seguiram, de mãos dadas (de um lado grandes mãos) a caminhar com passos largos (do outro lado com passos significativamente maiores) pela vida...

Gabriel Dietrich
Enviado por Gabriel Dietrich em 24/03/2010
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