E UMA VEZ DESNUDA...
Eu que não sou poeta cheguei ao alto da montanha e fui logo invadida por uma vontade de fazer versos,de voar. “Voar alto rumo ao infinito do desejo” de lançar um olhar distante como se com ele eu pudesse ultrapassar “os limites apertados do meu arranjo existencial”, de plagiar Clarice Lispector e do alto desta montanha soltar “ o grito áspero e agudo e prolongado, / o grito que eu, / por falso respeito humano / não dei”.
Relendo o que escrevi acima eu me pergunto, por que o desejo de voar, de fazer versos, de gritar...? Ah, como são interessantes os que escrevem! Como é envolvente a magia da nossa própria transformação em herói, em bandido, em mocinho, mocinha... Imaginamos tais personagens e criamos situações, cenários, enredos intrigantes, nos situamos e passamos a viver como se de fato personagens fossemos. Eu posso imaginar um ser, tomar sua forma, suas dores, eu posso falar de uma ilusão que se foi e eu não sei por que se foi; eu posso falar de amor, eu posso culpar o meu anjo da guarda por ter aberto a porta do meu coração para esse amor entrar; eu posso falar do quanto brigávamos e quanto representávamos para um teatro sem platéia; eu posso falar da experiência de ter chorado por alguém; eu posso falar de um amor não correspondido e, finalmente, eu posso falar de um adeus antes do esperado, um adeus de quem não escolhi pra receber... Para em seguida desnudar-me da personagem e deletar sua história.
E uma vez desnuda, cá estou, eu, Zélia Maria Freire, cidadã bem comportada, que vive com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar e que só não vai ao zoológico aos domingos dar pipoca aos macacos porque aqui na terrinha não tem zoológico.
Eu que não sou poeta cheguei ao alto da montanha e fui logo invadida por uma vontade de fazer versos,de voar. “Voar alto rumo ao infinito do desejo” de lançar um olhar distante como se com ele eu pudesse ultrapassar “os limites apertados do meu arranjo existencial”, de plagiar Clarice Lispector e do alto desta montanha soltar “ o grito áspero e agudo e prolongado, / o grito que eu, / por falso respeito humano / não dei”.
Relendo o que escrevi acima eu me pergunto, por que o desejo de voar, de fazer versos, de gritar...? Ah, como são interessantes os que escrevem! Como é envolvente a magia da nossa própria transformação em herói, em bandido, em mocinho, mocinha... Imaginamos tais personagens e criamos situações, cenários, enredos intrigantes, nos situamos e passamos a viver como se de fato personagens fossemos. Eu posso imaginar um ser, tomar sua forma, suas dores, eu posso falar de uma ilusão que se foi e eu não sei por que se foi; eu posso falar de amor, eu posso culpar o meu anjo da guarda por ter aberto a porta do meu coração para esse amor entrar; eu posso falar do quanto brigávamos e quanto representávamos para um teatro sem platéia; eu posso falar da experiência de ter chorado por alguém; eu posso falar de um amor não correspondido e, finalmente, eu posso falar de um adeus antes do esperado, um adeus de quem não escolhi pra receber... Para em seguida desnudar-me da personagem e deletar sua história.
E uma vez desnuda, cá estou, eu, Zélia Maria Freire, cidadã bem comportada, que vive com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar e que só não vai ao zoológico aos domingos dar pipoca aos macacos porque aqui na terrinha não tem zoológico.