Fechada para balanço.

Dia primeiro de janeiro. Dia de renovação. Dia de usar a roupa nova comprada com o décimo terceiro ou com o que sobrou do limite do cartão de crédito. Dia de encerramento da orgia alimentar iniciada no último mês do ano que passou. Dia de visitar os parentes e amigos esquecidos no Natal ou durante o ano anterior. Dia de andar pela praia despreocupadamente. Dia de andar a cavalo ou dar um passeio de carro sem destino. Dia de ficar prostrada no sofá, zapeando e vendo os programas mais improváveis. Dia de sentimentos contraditórios: alegria e tristeza, nostalgia e ansiedade, paz e desespero. Mas me pergunto: onde estará o sentimento socialmente compartilhado? Quase um “dever de todos”? Aquele que nos faz desejar um feliz ano novo à família, amigos, colegas, vizinhos, inimigos e a nós mesmos, pular sete ondinhas, comer sete uvas, colocar uma folhinha de arruda na carteira, além de fazer promessas que provavelmente não serão cumpridas? O sentimento que faz os organizados escreverem suas metas e compromissos em agendas? Os ansiosos a procurarem astrólogos, cartomantes, mães-de-santo, pais-de-santo, pastores, anciões ou qualquer tipo de oráculo? Os religiosos a fazerem seus pedidos e promessas? Os doentes a acreditarem na cura? Os namorados em se casarem? Os casados na perpetuação dos laços? Os desempregados na carteira assinada? Os talentos no sucesso? Os bem-sucedidos na continuidade? As empresas no aumento dos lucros? Os sem teto no sonho da casa própria. Os sem terra na reforma agrária? Os políticos na reeleição? Os nacionalistas no país? Os ativistas do Greenpeace na melhoria das condições ambientais? Os defensores dos direitos humanos no mundo? Onde estará o sentimento que elegeu e reelegeu Lula? Onde estará o sentimento que levou Obama ao poder?

A sabedoria popular diz ser ele o último a morrer, mas como toda regra tem exceção, minha Sombra hoje acordou mal humorada e disse nada feito. Você ficará em casa hoje e reverá 25 anos. Não fará nenhum projeto, promessa, não desejará feliz ano novo a nenhum amigo. Seus pais irão passear e você ficará em casa. Sua irmã sairá com o namorado e suas avós e tias não darão o ar da graça. Para não se sentir sozinha, ligará TV e ouvirá músicas desconhecidas na MTV. Verá um filme antigo e depois dará um passeio de carro, devolverá aquilo que não lhe pertence, apagará fotos antigas e se desfará de objetos que já não fazem mais sentido. E quiçá ao fim do dia prometa que um inicio de ano como esse só daqui a 25 anos.

LUCILA GRACINDA
Enviado por LUCILA GRACINDA em 24/03/2010
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