Quero falar das minhas tristezas.
Mas ninguém gosta de ouvir a(s) tristeza(S) alheia. Pra quê? Coisa chata. De problemas bastam os meus. Quer dizer, algumas vezes é até divertido, quando sentimos aquela sensação mórbida e prazerosa de ouvir o fracasso do vizinho.
É como ir ao circo: todo mundo prende a respiração quando o trapezista está desafiando o perigo nas alturas. É óbvio que não queremos o mal dos artistas circenses, tanto que ficamos nervosos na hora em que eles (propositadamente) quase escorregam. Mas lá no fundo, bem no fundo, todos nós desejamos vê-los cair. Do contrário não haveria razão de pagar ingresso, ora bolas, afinal eu já saberia que não há a menor possibilidade das estripulias darem errado mesmo. Ouvir tristezas é mais ou menos parecido.
Pois então, quero falar das minhas tristezas. Mas não quero falar em vão. Quero que me ouçam, leiam, pensem, reflitam. Minhas tristezas tem que servir de alguma coisa.
Quero realmente falar das minhas tristezas. Não quero ficar triste à toa. Preciso ouvir alguém falar que há males que vem para o bem. Que tudo tem um lado bom. Que as nossas escolhas tem metade da chance de dar certo. Que todos nós temos um fardo a carregar, um carma maldito. Que nós temos nas mãos o pecado de nossas vidas, e que sofrer leva a salvação eterna. Que o melhor a se fazer é levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima. Que ficar cabisbaixo não me levará a nada. Que sorrir é o melhor remédio.
Alias, porque não se vendem sorrisos na farmácia? Sorriso não é remédio? Onde se vende remédio?
Aí me chegarão algumas pessoas com alegria no rosto e dirão: "Ah, mas para conseguir um sorriso basta querer, basta acreditar e sonhar com um futuro melhor". Ótimo, então troque de lugar comigo e daqui a um mês diga-me se é fácil driblar minhas tristezas.
Quero falar das minhas tristezas, mas não quero ser catequizado. Não entrarei em nenhuma Igreja seja ela de qualquer religião. Não quero beijar a mão do Padre, nem ouvir o Pastor.
Quero falar das minhas tristezas, mas não quero fórmulas mágicas.
E bem que eu poderia virar Australiano, ou Francês, ou Libanês (Ah, não, lembrei que eles estão morrendo), para não precisar votar no Lula de novo. E, acima de tudo, para não precisar votar em ninguém que não seja ele. Eleição renova minhas tristezas.
Pois me lembro que não importa que todos os dias eu vá até a janela e veja o sol nascer (nunca haverá, nem em mil anos, espetáculo mais lindo, que me enche de felicidade e esperança), ele sempre irá de pôr dentro de algumas horas. E vem novamente a noite, escura, fria, sussurrando meus medos na penumbra do meu quarto.
Quero falar das minhas tristezas, mas se alguém pretende ouví-las, me procure de madrugada. Será um prazer desabafar. Pois de manhã eu já tenho compromisso. Vou lá na minha janela ver mais uma vez o sol nascer, e então não mais terei tristezas para compartilhar.
Danielfaraó