A Peruca do seu Osni
"Há dias em que a gente se pega revirando baús na despensa imunda de casas de aranha e pó que fica no fundo do córtex cerebral."
Bonita maneira de dizer que tem dias em que a gente vive de lembranças na "cachola".
Outro dia, eu, revirando esse tal "baú do córtex", voltei à idade dos dez anos.
Volte você também: Que viagem heim?
__ Menino, sai desse chão quente que te faz mal a garganta!
__Menino, vai tomar banho! Esfrega esse pescoço pra não criar "cordão de ouro"!
Aos berros, minha mãe gritava comigo. A constante de Columb e todas as suas potências não seriam mais insistentes.
èramos três irmãos em casa: Lucas, o mais novo tinha quatro anos; Félix tinha seis e eu, a meninice e a vivência de uma década de descobertas. E não eram poucas.
Papai trabalhava viajando e mamãe, há muito tinha largado o rabalho para se dedicar a boa criação dos meninos. Não adiantou muito não...
Embora papai mal parasse em casa, a palavra dele era lei. Ningué fra de casa na semana porque na semana se estuda.
__Nunca vi filho "rueiro" servir bem a um pai ou uma mãe. __ Muito rígido ele __ Meu filho aqui vai ser advogado, que é profissão de dinheiro.
Antes tivesse ouvido aquele velho visionário. Sou arquiteto.
E as brincadeiras da rua? Não sei como é que uma criança hoe se sustenta às custas de computador e videogame.
Nossa! Eu tive uma grande infância!
"CAi no poço", beijei muita menininha... Sai no tapa com muitos meninos também.
"Polícia e ladrão"
__" 'Bora' vagabundo, confessa logo o que tu roubou!
__ "Só uma geladeira, seu guarda" __ uma geladeira??
"Bandeira" foi a brincadeira de rua que eu joguei mais! Uma correria sem propósito que eu nem entendia bem do que se tratava. Eu não tava nem ai, eu queria mais era correr e gritar.
"Sete pecados". Não sei como não estou de pulmão manchado. Nunca consegui pegar aquela bola.
"Carimba". Essa sempre foi a mehor. Nunca consegui ganhar da Rita. A danada da menina era um canhão.
Ainda é.
Quando a gente se cansava vinham os dilemas da vida. Naquele tempo, mesmo crianças tinham suas indagações e certos temas eram motivo de grandes discussões.
__O seu Osni tem o cabelo tão arrumadinho, né?
__Ô jegue"!__ alto nível de conversação__É claro que é peruca, né?
__O seu tunico do taxi já chegou na casa da dona Marcinda...
__E o seu Tomé já foi lá pra calçada tomar um ventinho no rosto..
__Na verdade, um ventinho na testa.
__Como é que um cara deixa a mulher sozinha em casa com o outro e fica na calçada tomando "ventim"?
Dizem que uma vez ele entrou em casa assim de uma vez e pegou os dois no "falgra".
__Sei não..
__Sei lá...
a gente nunca conseguiu entender. O cara do táxi vinha, o don da casa ia tomar o tal "ventim". O cara do táxi ia embora, cumprimentava o seu Tomé discretamente. O seu Tomé entrava. Fechava as portas. Caladinho.
Volta e meia eu reviro outras caixas no tal "baú do córtex". Mas nenhuma tem mais episódios legais como este.
Agora me intriguei: Será que era mesmo peruca que o seu Osni usava?