NOSSOS ÍDOLOS MORREM CEDO? NEM TODOS.
Separar as coisas. Seria o correto. Digo seria, porque o jovem, em geral, ama visceralmente e daí vem sua identificação com seu ídolo. Nem sempre imita. Mas quando ama o cantor, a música, o ator, acaba quase sempre imitando seu modo de vestir, de falar, de agir, de pensar.
A linha divisória entre o ser humano e o personagem se torna tênue. Bons exemplos, ótimo. Boas idéias, excelente. O perigo começa quando o ídolo envereda por caminhos esburacados e o fã, desprevenido, vai junto. Porque o jovem, principalmente na adolescência, quase sempre não tem o discernimento para separar a obra do autor. E o autor é humano. É gente. E, como todo o humano, tem fraquezas, erra.
A vida artística, principalmente no meio musical, é diferente. É uma realidade que quase sempre se confunde com a fantasia. E o jovem sonha muito. O ídolo, por exigências da carreira, pelo próprio meio, vive em constante agitação, sob a mira dos paparazzi, dos fofoqueiros de plantão. Quase sempre sua vida privada é exposta, é devassada. A tensão, o cansaço, a necessidade de demonstrar energia no palco, as facilidades, o dinheiro aos borbotões, o próprio ego inflado, causam sérios problemas psicológicos. Então o ídolo sucumbe. Sucumbe à pressão, sucumbe às facilidades, sucumbe à fraqueza diante dos atrativos que a fama oferece. Aí vem a depressão, a solidão, a insatisfação interior , que esta ninguém vê. Despreparado para o sucesso, as vezes galopante, ele envereda caminhos obscuros e busca muletas para não deixar transparecer suas angústias, sua falta de vida interior.
O perigo não mora mais ao lado. O perigo bateu na porta e o jovem, despreparado, abre. E de roldão vai pela trilha aberta pelo ídolo. Supõe-se que o ídolo deveria dar bom exemplo. Mas não podemos esquecer que ele é um espírito imortal que, como nós todos, aqui está tentando acertar e cumprir sua missão no plano terreno.
Nossos ídolos morrem cedo. Infelizmente as drogas lícitas ou não, são um apelo e os levam antes do tempo. Por isso é importante separar o homem da obra. É aí que entram as conversas e os exemplos dos pais. Nem sempre adianta, mas alertar é necessário.
Meus ídolos, muitos deles, morreram cedo. Chorei quando perdi Elvis Presley, Fred Mercuri, Elis Regina, Antonio Marcos, Janes Joplin, Raul Seixas... Assim como chorei quando se foram John Lennon, Jessé, Clara Nunes, embora estes em circunstâncias diferentes. Sempre tive a sensação que se foram as melhores vozes da minha juventude. A geração posterior, que conheci através de minha irmã, perdeu também para as drogas vários jovens ídolos. Renato Russo, Cazuza, Cássia Eller. Até a geração da minha sobrinha, à época criança ainda, já teve perdas com os Mamonas Assassinas. Eles vão, a obra fica. E é isso que nossos jovens têm que saber separar. Admirar a obra, compreender o homem.
Por outro lado, nem todos os meus ídolos e os das gerações subsequentes morreram. Não sei se porque espíritos mais fortes, que não se deixaram levar pela correnteza da fama ou por físicos privilegiados que resistem até hoje à ação destruidora do vício. Conservo Roberto Carlos e Erasmo. Tenho Paul Mac Cartney, Maria Bethânia, Martinho da Vila, Titãs, Fagner, Chico, Milton... Tenho os Beatles na memória. Aí está o Mike Jaeguer que se não é um exemplo a ser seguido, resistiu ao tempo e à ação dos refletores. Temos casos em profusão deles, que conseguiram abrir caminho na fumaça da fama e desembotaram o cérebro. Tem o Fabio Assunção, o Mel Gibson, a Whitney Houston e tantos outros que buscam ajuda e lutam contra a maré. Não posso falar de Amy Winehouse que parece não ter conseguido vislumbrar a luz e a força espiritual contra o álcool e as drogas. Quanto a cantora Pitty, as opiniões se dividem.
Conselhos na juventude muitas vezes se transformam em palavras ocas ou mímicas de mudez. Ou porque eles não entendem a necessidade de separar as coisas ou porque estão com os MP 3, 4, 5, 6... no ouvido. Mas é nosso dever alertá-los, mostrar onde mora o perigo. Que mudou de residência. Deixou de ser vizinho para se transformar em inquilino na nossa casa. É nossa urgente missão fazer o jovem entender que a obra é do ídolo, mas o ídolo não é a obra. Que a obra é imortal, enquanto o ídolo é de carne e osso e, se cair no fundo do poço, morre. Que ele admire a obra, mas deixe de lado a curiosidade de espiar o poço, pois pode cair e nunca mais sair. O monstro sempre estará lá, para puxar para baixo os que se aventurarem a espiar. E o socorro muitas vezes chega tarde. Vamos fazer nossa parte, não deixando que essas lâmpadas luminosas se apaguem, ofuscadas pelo brilho efêmero dos seus ídolos.