Vivendo e aprendendo
Não sei se é de todo bom ter boa memória. Consta da literatura que as más lembranças são colocadas de lado no arquivo humano e, graças a isso, conseguimos levar uma vida relativamente normal sempre com “boas” lembranças. Será que essa estatística está correta? Penso que não.
Existem certos acontecimentos que obrigam uma família ou um grupo de pessoas tomarem um atalho na vida que não tem nada a ver com o que seria o futuro delas até então.
Certa vez li um livro que não era nada mais e nada menos que um monólogo sobre a chave do esquife do filho, morto devido traumatismo causado por uma bolada num jogo de futebol. Lá houve um enterro, velório, choro, tristeza e tudo que acompanha um acontecimento desses numa sociedade como a nossa que, embora não seja um procedimento lógico, é assim por tradição.
Tragédia não é novidade, mas a forma como se procede na ocasião vem a ser, pela circunstância e pela personalidade dos envolvidos. Talvez o que realmente deixou a impressão é que faltaria um pedaço a ausência da execução desse ritual por ocasião do falecimento de um ente querido.
O que ocorre em nossas vidas após os fatos também é normal, no sentido de que em cada cabeça sobrou um tipo de obsessão como proteger os filhos restantes, evitar que passemos pelo constrangimento de comentários alheios, outros querendo se assemelhar ao falecido, ou ainda tentando se diferenciar para mostrar personalidade própria. Evitar lágrimas escondendo objetos, escondendo música, evitando festejos para demonstrar eterno luto e sobre tudo (provavelmente o maior erro de todos os envolvidos) evitar falar no assunto.
Será que perdemos alguma coisa irrecuperável? Ou adquirimos vivência e experiência de vida de uma forma triste, mas perfeitamente normal em meio a um mundo de reles mortais?
O que sobrou para nós disso tudo foi muita força, muita sensação de pé no chão, muito realismo e capacidade de análise das coisas com a eterna precaução de que certos fatos acontecem e se não quiser passar por eles --- NÃO VIVA.
Há poetas que dizem que viver é sofrer, mas não é não. Viver é saber o que estamos fazendo aqui.
Gosto de olhar as coisas pelo lado positivo e sem neuras, portanto eu penso que se sofremos para aprender, esse sofrimento valeu. Se houve distorções de comportamento após o ocorrido deve ter sido por um acúmulo de motivos que no resultado final se transformou em algo apreciável e não negativo. Respeito quem pensa diferente.