Talvez ausência.

Serão incontáveis as vezes que nos sentimos sós, em meio a uma multidão. Isso já foi cantado em prosa e verso e a palavra solidão se transformou em algo que tem tanta forma de sentir que já deve estar entre as palavras de significado mais abstrato de nossa língua.

Quando uma criança me perguntou o que era um quadro abstrato, eu respondi, apontando para uma pintura, explicando que ali não se via um desenho definido, ao que ela contestou dizendo ter ali a figura de uma boneca de pano. Penso que a solidão está com esse tipo de visão. Depende sempre do observador ou daquele que a está sentindo. Por vezes ninguém a está sentindo, mas quem analisa erradamente uma pessoa como vivendo em solidão e ela mesma nem se dá conta, ou acha que é apenas esquizofrenia de quem está pensando assim.

Uma pessoa que se acha diferente, por não ter amigos, curte um tipo de solidão, quase como uma doença, sendo que pode apenas, por timidez, não se adaptar ao meio em que vive. Quantas vezes ouvi pessoas interagindo com um grupo de arte, depois de anos em uma profissão totalmente divergente, e aí sim, se sentindo em casa, concluir que finalmente acharam seu grupo e não estão mais sós. A necessidade de sobrevivência e de sustento próprio nos faz abraçar carreiras ou formas de vida que não nos satisfazem, e só iremos saber o quanto perdemos tempo no momento em que ocasionalmente nos integramos em um grupo, seja ele do que for. Até esportistas tardios têm aparecido sempre com o objetivo de se encontrar e fugir daquilo tão temido que seja a sensação de solidão.

Casais que trabalham em funções diferentes, têm amigos diferentes, fatalmente terão costumes diferentes e cada um deles sempre se sentirá só quando estiver participando de uma reunião em que o grupo é o do cônjuge. É o tipo de solidão que maltrata, pois está com a pessoa que lhe é mais próxima e, no entanto está ocasionando um distanciamento de léguas de distância nesse determinado momento. Isso se repete com bons amigos de um escritório que em condição adversa, como festa familiar, irá se sentir um peixe fora d’água e o grande amigo passa a ser um estranho e o relacionamento estará sempre ligado ao ambiente em que estiverem.

Casos de falsa solidão são incontáveis, mas quem está pelo lado de fora de uma vida jamais poderá analisar o que faz um indivíduo se sentir em estado de solidão.

Uma coisa é certa: a palavra está errada, pois solidão deveria significar apenas alguém sem outro alguém por perto, e, no entanto, solidão se transformou em um estado de espírito, que não pode e nem deve ser analisado por quem apenas observa. Está dentro da maneira de ser de cada um e jamais na ausência de quem quer que seja.

Ana Toledo
Enviado por Ana Toledo em 10/03/2010
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