Os problemas de cada um

Você anda pelas ruas e avenidas da sua cidade nos diferentes cantos do mundo, e vê tanta gente. Não sabe o que se vai em cada uma delas. Não enxerga sua alma, nem há como fazê-lo de modo preciso. E se você não está bem, calcula que todos estão melhores que você. É como se no vagão do trem da vida, o pior lugar fosse o seu. Mas claro, tudo isso é exagero.

O rapaz deitou um pouco das suas histórias. Entre elas, as dificuldades com o pai e mãe. Ambos com severos problemas de saúde. E ele como filho único a cuidar dos dois, que faz tempo já se separaram. Estes pais que um dia cuidaram dele. E enquanto o jovem contava a sua realidade, sem fazer isto de modo a buscar compaixão, demonstrava serenidade. E diante da afirmativa de que estava lidando bem com tudo, não negou a impressão causada. Esse rapaz já tomou o rumo à sua casa faz algum tempo neste dia de hoje. Já escreveu o trajeto pra sua casa. E já foi visto por inúmeras pessoas.

Não sei qual meio de transporte ela utiliza para ir à faculdade. Isto seria detalhe interessante. Mas o que vale é que ela é vista por muitas pessoas. Aqueles que a notam, não se pode afirmar o que pensam. Também não sei se é possível perceber que ela vive dias turvos, causa da sua segunda separação com o mesmo marido. Fato que lhe tem dado dias tão "pesados" e que trazem o "cansaço emocional" de agora. Uma mulher muito especial, mas que a vida resolveu lhe ser dura por duas vezes. Pudesse beijá-la a face e ofertar-lhe algum sorriso, o faria sem pestanejar. O que me sobram são apenas palavras de conforto, bem como de divisão dos meus momentos. Detalhes da separação não os tenho. E de fato o que menos tenho são detalhes.

Quando saiu do consultório sentia-se confuso, perdido. Viu que abandonar a terapia era melhor jeito de seguir a vida, precisava tomar as rédeas de si novamente. Claro que culpou a terapeuta por sentir-se tão indeciso. Mas claro que também deve exagerar na crítica. Tudo bem que suas decisões se mostram vacilantes à primeira crítica, a tal ponto de recuar na decisão. E aí por vezes se vê vacilante. E comete enganos, atrasos e faltas. Esse é seu pequeno sofrimento de agora.

Não se trata aqui de comparar os três sofrimentos, senão mostrar que cada um sofre numa certa medida. O macro é o sofrimento. O que se pretende aqui é manifestar o desejo da compreensão. A cara amarrada, a pequena arrogância - quando não muita -, a falta de paciência, as deseducações. Tudo que pode ser circunstancial. E tudo que pode ser compreendido. O caminho da compreensão pode ser o da paz com os outros. E a melhor maneira de praticar isto é ver no outro seu espelho. E você pode fazê-lo andando pelos diferentes lugares porque passa. E isto se dá pelo mundo. Na rua de agora, na avenida de ontem. Nos lugares de amanhã. Em todo este mundo. E não é que estejamos num mundo de só sofrimento. Este faz parte. Todos temos nossa vez. A forma como reagimos é que difere, disse-me a mulher especial de um dos parágrafos deste texto.

Daqui a pouco, tomo meu rumo. Vou para a minha casa. De ônibus, creio. Na vinda pra cá, para o trabalho, vi muitas pessoas. E fui visto por outras tantas. Observei, que sou observador, embora às vezes me cerre em meu mundo. E tantos outros indivíduos fizeram o mesmo que eu: deslocaram-se. Viram. Foram vistos. Cada um com seus pensamentos, suas alegrias, suas mazelas. Tudo na sua medida. É este um pouco do nosso mundo. É um pouco da nossa vida. Que passa do mesmo modo que passamos pelo outro pelas ruas e avenidas. Assim caminhamos.