Hoje termino de quitar os débitos de um dos meus sonhos
Finalmente o dia chegou!
Ano passado, no início do mês de setembro esse dia parecia distante e eu imaginei que a minha caminhada seria longa e penosa. Felizmente me enganei. A caminhada apesar de ser dura (perdi o recesso de natal e ano novo) transcorreu na mais perfeita normalidade.
Hoje termino de quitar os débitos contraídos por causa de um dos meus sonhos. Não me arrependo de forma alguma de tê-los contraídos e se tivesse que fazer tudo novamente eu faria de olhos fechados e sem hesitar.
Os fatos se desencadearam a partir do momento que consegui passar no vestibular para Direito na universidade estadual. É um curso bastante concorrido, pois aqui onde moro além da universidade estadual apenas uma universidade particular oferece esse curso. E a mensalidade, diga-se de passagem, é muito salgada.
Funcionária pública de dinheirinho contado não podia subtrair o dinheiro dos filhos mesmo que fosse para realizar um sonho. A universidade pública restou como única opção. Muitos anos sem estudar e estudando sozinha nos raros horários vagos eu não consegui passar na primeira tentativa. Teve a segunda, a terceira e fui ganhando experiência. Sabia que seria difícil concorrer com jovens de “cabeça frasca”, saídos recentemente de cursos preparatórios e estudando pelo menos umas seis horas diárias. Mas não desisti.
Enfrentei as críticas de meu marido que dizia que eu não precisava passar por aquilo, pois já possuía curso superior e emprego estável (sou formada em pedagogia e tenho três anos de serviço público).
Enfrentei também os olhares incrédulos das pessoas (vai tentar de novo?) diante da minha insistência.
Confesso que quase desisti na quarta tentativa. Nos outros três últimos vestibulares eram quarenta vagas e me assustei quando vi o edital reduzindo a quantidade de vagas para trinta. Respirei fundo e pensei comigo mesma: Se eu desistir agora todo o meu esforço anterior terá sido em vão. Reunindo as derradeiras forças tentei novamente.
Ver meu nome figurando no décimo quinto lugar na lista de aprovados foi incrível. Fiquei imensamente feliz e pensei que o meu calvário havia terminado. Doce engano. Estava começando naquele momento.
A universidade estadual oferecia vagas somente para o período vespertino e eu trabalhava das oito às doze da manhã e das quatorze às dezoito da tarde.
Na lei dos funcionários públicos federais constava um artigo que amparava o funcionário estudante cujo horário divergisse com o do trabalho. Abria-se um horário especial para o caso. Entretanto essa mesma lei destacava um parágrafo onde dizia ser obrigatória a compensação das horas trabalhadas. Sem pensar entrei com o processo solicitando o tal horário especial.
Enquanto aguardava o resultado do processo as aulas começaram e por minha conta e risco comecei a estudar. De março a julho foi um período terrível. O resultado do processo não chegava e a chefia me pressionava ameaçando cortar o ponto caso permanecesse estudando. Apesar do medo das ameaças eu continuei a estudar. Precisava concluir o semestre para garantir a vaga na universidade, pois calouros eram proibidos de trancarem o curso.
No mês de agosto o tão esperado resultado do processo surge. Foi negado o meu pedido para o horário especial. A alegação era que o horário das aulas na universidade não permitiam que eu compensasse as horas não trabalhadas. E eu não poderia utilizar as férias da universidade para fazer a compensação.
Fiquei triste, porém não me desesperei. Havia concluído o primeiro semestre com notas excelentes e garantido a vaga na universidade. Tinha também conhecimento que a universidade abriria vagas para a noite em 2010.
Tirei cópia do processo que negava a continuação de meus estudos e fui conversar com a coordenadora. Ela me deu uma notícia ruim e outra boa. A ruim era ser improvável que o meu pedido de trancamento de curso fosse aceito (somente poderia ser feito com a conclusão de dois semestres letivos) e a boa era que o fato de ter concluído um semestre não perderia mais a vaga. Porém, havia um problema: Se eu não conseguisse o trancamento do semestre que estava cursando seria reprovada por faltas.
Não aceitei a possibilidade do meu histórico constar reprovação por faltas, manchando as minhas ótimas notas. Mesmo sem chances de aceitarem o meu pedido, entrei com a solicitação de trancamento de semestre argumentando toda a minha situação.
Em meu trabalho fui indagada a respeito das horas que eu estava devendo para a repartição. Eu deveria decidir entre compensar as horas não trabalhadas ou ter uma redução drástica no contracheque.
Desde setembro do ano passado cumpro uma jornada de dez horas diárias. Entro às sete e saio às treze horas, retornas às quatorze e saio às dezoito horas.
Em dezembro meu melhor presente de natal foi a confirmação do trancamento do curso pela universidade.
Hoje, cinco de março de 2010 termino a compensação das minhas horas não trabalhadas. Estou quite com o meu Órgão onde trabalho.
Em agosto recomeço as aulas no período noturno.
Não importa quantos muros tive que pular ou dificuldades que enfrentei, pois na minha opinião tudo valeu à pena. Sempre tive um enorme desejo de fazer o curso de Direito.
Não sei se vou exercer a profissão. O que quero mesmo é realizar esse sonho que por causa do casamento e dos filhos pequenos não consegui concretizar na época devida.
Agora é bola para frente e esquecer todo esse drama vivido.