"ALÔ, PAPAI..."
Um comercial na tv me chamou a atenção: uma menininha conversa com o pai. Pergunta se é verdade que ele não vai mais morar com ela. O pai, confirma e, ato contínuo, dá para a filha um aparelho de telefone celular (no caso, o da marca em questão) sugerindo que, apesar de ele não estar ali, eles nunca estarão separados ou ela nunca se sentirá sozinha. O anúncio segue mostrando a menina em várias situações: ela vê uma novidade, liga para contar ao pai; acorda à noite, em meio a um pesadelo, liga novamente. O pai a acalma, e ela fica tranquila porque “o monstro já foi embora”. Tudo lindo e natural demais para uma menininha daquela idade.
Atrás disso, o interesse comercial pela venda do produto, é claro, no caso, um telefone. Afora, a questão do anúncio, vem o lado da família e da relação pais e filhos. O mundo tecnológico, cada vez mais, toma o lugar do que se espera dos pais, ou seja, estar ao lado dos filhos, fazer-se presente na hora da necessidade, do medo ou da insegurança. Na correria da vida moderna essa proximidade torna-se cada vez difícil, o que é lamentável.
Muitas crianças são “pajeadas” por desenhos animados, jogos de videogame ou de computador. E o desencargo de consciência? Dentro de casa estão protegidos, se estão quietos, com os olhos grudados numa tela, melhor ainda, assim não dão trabalho a ninguém, nem correm o risco de se machucar em correrias ou brincadeiras perigosas. Aí, é o outro perigo que mora atrás dos jogos e brinquedos eletrônicos, o que já é outra história...
Assim “pajeadas”, as crianças brincam cada vez menos. Não inventam mais os próprios brinquedos, não tomam sol, não socializam, não aprendem criando suas diversões, desenvolvendo através delas seu poder de imaginação. Onde ficaram as pipas, os boizinhos de batata, as vaquinhas de quiabo, os carrinhos de madeira ou de rolimã, as bonecas de espigas de milho, os caquinhos que faziam mágicas no brincar de casinha, e tantas outras invencionices deliciosas? Isso era brincar, porque a criançada interagia, fabricava, dava vida ao que “inventava” e, indizível, era a satisfação encontrada nas aventuras que extraíam do próprio universo infantil.
Brinquedos à parte, o fato é que a tecnologia avançou em todos os setores sociais, inclusive, e de forma decisiva, para dentro da família. E a discussão e reflexão sobre isto? A modo de compensação pela ausência, pais presenteiam filhos com o que, no final, não passam de “babás eletrônicas”. Cientes disso, empresas investem neste terreno fértil. E querem nos fazer acreditar que uma linha de celular resolve, naturalmente, as carências de um filho em relação aos pais.
Então a pergunta: na hora do pesadelo no meio da noite, quando um monstro terrível resolve atacar, o que uma criança amedrontada prefere? O colo quente da mamãe, o abraço forte do papai, ou uma voz distante num aparelho frio, dizendo que tudo vai ficar bem? Ela com certeza tem a sua preferência, mas talvez não tenha escolhas... Enquanto isso, “alguém”, de olho atento, quer vender o seu produto...