Ontem eu fui roubado

Ontem eu fui roubado.

Hora errada no lugar errado (como acontece com todo mundo).

Um sujeito é o dono do mundo porque tem um "três-oitão" na mão. E nós, simples cidadãos é que pagamos o pato. Mas convenhamos, a culpa não é totalmente do sujeito com a arma na mão.

A história começa assim:

Ao terminar a última aula da faculdade eu vim embora para minha casa - moro a 10 minutos a pé de distância da faculdade -, e como de costume, vim com os meus colegas até proximidades da minha casa (diga-se de passagem que eu não precisava passar pelo caminho que passei).

Bom, sem delongas, eu vi aproximar quatro sujeitos e meu coração disparou - sabe aquele "sentido aranha" , haha ? -.

Um deles disse, se aproximando:

- Vai entregando tudo.

Eu, como não tinha visto que ele estava armado, reagi.

Quando se aproximou demais eu o empurrei fortemente e disse:

- Está ficando doido, meu irmão?

Cerrei os punhos e estava preparado para uma briga.

Ele deu uns três passos para trás, sacou o revólver, e disse:

- Não. Você que está ficando doido. Quer morrer?

Nessa hora, eu não sei o porquê deu ter reagido, afinal, quatro contra um, mesmo que fosse sem pistola, é uma desvantagem e tanto. Mas mesmo depois que ele sacou a pistola, ainda assim não tive medo. Foi estranho. É como se eu não importasse com isso, ou como se não tivesse medo (e eu tenho).

Ele enfim, de raiva, colocou a pistola na minha barriga - foi quando eu tive a certeza que era mesmo uma arma. Ele disse:

- Quer morrer?

- Quer morrer?

Aquela frase enfim penetrou a minha consciência; voltei a mim. Ele pediu meu celular, e achei que só. Mas ele quis também a mochila - Pô, depois que voltei a mim, vi que não tinha nenhuma maneira de reagir. Tanto porque eram quatro, quanto porque tinha um armado -.

Sim, entreguei o que ele me pediu, e disse:

- Cara, tem um livro da minha faculdade aí. Ele está emprestado. Deixa eu pegar.

Ele disse:

- Não, só por você ter sido um otário, eu vou levá-lo (não necessariamente com essas palavras).

Me deu uma coronhada na cabeça e disse:

- Tu tem sorte de estar vivo.

Ah! Sim. Quando ele disse isso, mandou eu e um cara ir embora. Foi quando vi que eles não eram quatro, e sim três. Um cara que estava lá tinha acabado de ser roubado também. Engraçado é que só um deles agia. Os outros só ficaram olhando. Fui embora.

Minha adrenalina estava a mil. E eu fiquei muito bravo porque não reagi. Duas horas depois, eu ainda estava com muita raiva e não sabia o que fazer. Ele levou algumas coisas importantes para mim. É lógico que celular e esse tipo de coisa é irrelevante, mas ele levou coisas que eu gostava muito, além de documentos. Não, ele não levou minha carteira. Levou:

Importantes para mim: Minhas anotações da faculdade, Um livro emprestado da biblioteca, meu contrato de estágio (que estava assinado por todas as partes e eu só tinha que entregar para as mesmas), um trabalho que não estava entregue, meu pen drive (documentos desde 2008), minha gaita e a gaita do meu irmão. Essas últimas são os menos importantes, mas elas tinham uma história.

Não Importantes: Meu celular.

Agora me diz, por quanto ele consegue vender tudo isso daí?

20 reais no máximo, para comprar drogas. Enquanto que eu terei que gastar uns 200 reais (ou mais, por causa do celular) para repor tudo, além do trabalho para pagar um livro emprestado e o para conseguir outro contrato de estágio.

Ele não levou meu tênis. Não levou o dinheiro da minha carteira; não levou nada e levou quase tudo - menos os documentos pessoais, ainda bem. Mané. Ele provavelmente ficou nervoso por eu ter reagido. Ele não esperava essa.

E depois disso tudo, uma frase ficou na minha cabeça: "Tu tem sorte de estar vivo". E tenho mesmo.

Com a adrenalina baixa, concluí que foi realmente melhor ter parado de reagir. Ainda bem que voltei a mim a tempo. Afinal, coisas materiais são só coisas materiais, e a vida é o bem mais precioso que temos.

Ele tirou coisas importantes de mim, mas não tirou meu conhecimento. "[...]Podem me tirar tudo que tenho, só não podem tirar as coisas boas que eu já fiz para quem eu amo[...]Histórias, nossas histórias[...]"¹.

Mas pensando bem, ele devia ter uma razão. Já o perdoei. Afinal, a culpa não é só de quem está com a arma na mão. Deus é quem sabe todas as coisas.

Todos nós somos só crianças que não sabem como agir; Uns seguem o caminho do bem, outros seguem o caminho do mal, e outros seguem os dois caminhos.

Só para constar: "O mundo não precisa de mais dinheiro; o mundo precisa de amor".

¹ : Dias de luta, dias de glória - Charlie Brown Jr.