Fui tratada como rainha, embora fosse plebéia.
Entrei naquela manhã, tremendo da cabeça aos pés. Era meu primeiro teste, se passasse teria emprego de carteira assinada; veria concretizar-se meu sonho de poder comprar tudo que quisesse com meu salário. Naquele momento começaria, de verdade, a minha carreira profissional.
Fui conduzida ao departamento de RH, e logo depois apresentada ao chefe do setor. Gentilmente fui conduzida até uma carteira, recebi as folhas do teste. Dei uma espiada, e entrei em pânico. Aquilo não era um teste, era um vestibular! Eu, na altura dos meus dezesseis anos, sem bagagem nenhuma, sabia que não adiantava perder tempo. Estava fadada ao fracasso.
O chefe do setor, não saia de perto, e eu suava em bica. Sabia que se ele ficasse mais um segundo ali do meu lado, espiando e constatando minha incompetência, eu teria um chilique ou algo parecido. Mas para minha surpresa, ele me pediu que assinasse o teste, e o devolvesse em branco, aguardasse o resultado na sala ao lado. Ainda, mandou uma funcionária me servir café ou chá. Fiquei pasma. O que eu queria mesmo era sair correndo. Esperar resultado do quê? Eu não tinha respondido nada!
Passados trinta minutos fui chamada. De cabeça baixa entrei na sala e para minha surpresa ele me disse:
- Parabéns, você foi aprovada. Vá fazer os exames médicos e apresente-se segunda às oito horas.
Quase cai de costa. Eu passei? Como? Ele me olhou e com um tratamento singular disse que minha vaga já estava guardada, pois alguém importante dera ordens específicas para que fosse tratada com honra. Eu não entendi nada, mas precisava do emprego e fui cuidar dos procedimentos necessários.
Fui colocada no melhor setor da empresa, qualquer palavra que eu dizia era acolhida como se da minha boca jorrasse jóias. Todo mundo me tratava como se eu fosse uma rainha. No refeitório, no estoque, na recepção... Por onde passava o pessoal me olhava, cochichava e me dirigia um sorriso daqueles. Aquilo me inquietava, porém a timidez que sentia me impedia de fazer qualquer questionamento.
Fui transferida para uma filial, e novamente a coisa se repetia. Passei a ficar no setor de chocolate e vinhos finos. Não sei por que, e de quem foi a idéia, mas passei um dia distribuindo doses de vinhos e chocolates em miniaturas para os clientes. Pareceu gente até de um olho só, mas vender que era o objetivo da promoção, não se vendeu uma garrafa sequer. O gerente ficou com um sorriso congelado e eu ali abrindo garrafas. E os filões que não paravam de sair e entrar eram os taxistas. Classe que não tem um tostão pra comprar uma garrafa de bebida que, na época, valia um salário mínimo. Eu achava que estava arrasando, o gerente a ponto de puxar os cabelos, e as vendas despencando. Descobri, anos depois, que aquela loja estava passando por dificuldade financeira, e eu fora mandada pra lá para ‘ajudar’.
Novamente fui transferida, já que a loja fechara as portas uns dois meses depois. Voltei para a matriz, e ali descobri o porquê de tantos ‘mimos’. Um dos homens fortes da diretoria e que tinha poder de ‘assinar e apagar’ havia dito que uma sobrinha dele iria trabalhar naquela empresa, e quando eu cheguei todo mundo passou a pensar que eu era a tal sobrinha. Realmente eu era amiga da sobrinha do homem, mas estava certa de que eu e ela iríamos trabalhar naquela grande empresa, porém em locais diferentes. Eu fui tratada como rainha, e ela coitada, passou por teste, e tudo mais. Não ficou pra saber o resultado e depois desistiu de trabalhar. Era filha única, e optara por ficar com pais dando assistência na empresa dos mesmos.
Quando essa firma faliu fui atrelada ao grupo de funcionários que o homem forte levou para outra empresa que ele havia montado. Mas essa é outra história....