ESCREVER; DOM E RESPONSABILIDADE. NOBEL DE LITERATURA.
ORHAN PAMUK, que esteve entre nós, turco de nacionalidade, Nobel de literatura de 2006, láurea da academia sueca, concede a muitos o beneplácito decifrável de enquadramento de sua convicção, de que "PARA ESCREVER É PRECISO SER UM POUCO IRRESPONSÁVEL, COMO UMA CRIANÇA".
Por seu gosto pessoal, repele "NEVE", seu aclamado livro no Brasil e obra consagradora.
Prefere ser conhecido e reconhecido por "Meu Nome é Vermelho". Pamuk, segundo entrevista em Nova York - oásis da ira de seus algozes, acossados por seu triunfo - se irrita por pretenderem enxergar em seus livros somente mensagens políticas.
O dilema dos véus das jovens turcas muçulmanas, deu motivos para islamitas e ateus amarem ou odiarem o hábil e brilhante contador de histórias.
É romancista de cepa, de linhagem pois, de envergadura, um romancista que vê em Machado de Assis, a quem admira, um modernista muito estranho.
Por esta "sui generis" qualificação chega-se com facilidade ao seu centro criador.
Seu único livro político ao seu querer e credo, essencialmente, é "NEVE" .
Mas Pamuk quer ser conhecido como romancista. Mas não é dado ao talento o reconhecimento ao seu gosto, mas ao paladar da recepção leitora.
Sua aguda inteligência sabe, todavia, que interessa ao núcleo da comunicação, ao interesse do leitor múltiplo em soma, mais suas necessidades e interesses, conclamados, tratados e regrados pela política, do que a ficção, a boa ficção expulsando a mentira sob qualquer enfoque da literartua reconhecida e condenando com todas as forção os copismos subvertidos.
É antes de tudo um idealista. Como aqueles inocentes que estão mais perto das crianças e de suas inocências.
O traço do bom caráter que Deus aproxima dos pequeninos e afasta dos egoístas.
Por que a alusão ao agora famoso Professor da Universidade de Colúmbia?
Por sua indicação da necessidade de ser "um pouco irresponsável para escrever", quando na órbita das grandes conquistas da modernidade democrática, transita com desenvoltura plena a livre expressão.
O sistema de legalidade das nações libertas da opressão, seja qual for sua origem, limita a livre expressão a conter-se na distensão que não colide com direitos de terceiros.
As regras são absolutamente claras sob todos os aspectos, envolvendo a bilateralidade na composição da relação do fenômeno da comunicação, produção e recepção, que como todo fenômeno social tem conotação jurídica.
Quando um cultor das letras, elevado ao exponencial máximo das altitudes e cumeadas do Nobel, pontifica elegendo a irresponsabilidade no escrever como necessária, fazendo-o em entrevista, é imperativo fazer-se a devida leitura.
A leitura dessa afirmação não se faz ao sabor da literalidade comezinha, meramente semântica. Como o célebre teatrólogo italiano, Pirandello, construiu em sua significativa peça "Assim É Se Lhe Parece", deve se inferir a intenção, torná-la crível.
Pamuk, que pretende ser conhecido como romancista, não como pensador político (primeira leitura), conduz a escrever com "UM POUCO" de irresponsabilidade, porém, "COMO UMA CRIANÇA", (segunda leitura).
Pensadores políticos não escrevem como crianças, sempre inocentes. Mesmo assim, escrevendo "como crianças", acentua o escritor, deve se escrever com "um pouco", note-se bem, de irresponsabilidade sempre, contudo, afastado da mentira, seja qual for, de forma, identidade e conteúdo..
E essa irresponsabilidade aludida é de âmbito ficcional, romanceada.
Pamuk faz referência a seus romances e histórias sobre Istambul, em seus artigos, não como tema central da ogiva política que instabiliza oriente e ocidente.
É um cultor das liberdades políticas. Comedido nos ensina a simplicidade e a ironia.
Preocupado - disserta sua ironia - em como dar sua primeira aula na prestigiada Universidade de Colúmbia, frente ao brilhante alunado que freqüenta historicamente seus cursos, ficou ansioso no sentido do que iria abordar diante de tão seleta audição.
No dia, antes da aula, foi noticiado do Nobel conquistado. Disse que não precisou abrir a boca; eram só aplausos e festejos com sua presença.
Um apaixonado de Dostoiévisk, Tolstoi, Proust, e Thomas Mann, o escritor viveu entre livros e sempre foi um leitor dedicado.
Ensina, como meu pai, declinando que nunca abordou o que não conhece ou deu conteúdo político ao fato que desinteressa.
Sua centralização em "NEVE" demonstra sua lucidez na guerra dos símbolos em cuja religiosidade reside a política e nesta o teísmo.
Como todo ser naturalmente vocacionado por força dos dons pessoais, debruçado nos livros, fazendo a diferença, adverte aos seus contrários que escrever não é querer, é poder, explica, basta ver que nas artes plásticas, todos, até os mais rudes, rupestremente, podem se manifestar, diversamente de escrever, que além de dever fluir por ser ato de prazer inato e de dotação, está vinculado à leitura diária e cultura dimensionada.
Correto o professor-romancista e ente político, queiramos ou não.
Com razão o professor, a diferença, o reconhecimento público, em maior ou menor escala da comunicabilidade, atingindo centenas ou milhares, que traz prestígio e exaltação, incomoda a muitos de forma velada ou explícita, no silêncio guardado no pior dos sentimentos, a inveja.
Os vencedores distinguidos por seus méritos, levando-os a exercer com sobriedade as vitórias em suas existências, nas atividades embaladas no ato de escrever, embora a saboreiem com simplicidade, sinal de suas inteligências, têm ao seu lado a espreita dos fracos de caráter, dos covardes que escondem nas sombras a negatividade de suas personalidades.
Pamuk foi processado por pessoas com esses traços de personalidade, os nacionalistas turcos, resultando arquivado o processo. O seu reconhecimento internacional incomoda e inspira sentimentos contraditórios por sua visão pouco tradicional do oriente.
Acima de tudo o Nobel de literatura é "responsável" no que afirma politicamente e "um pouco criança" em suas histórias, por sinal ótimas, por força de seu dom etiológico de escrever.