Confesso que vivi...

 
Quando era criança, sempre questionava os meus pais, sobre meu nascimento, sobre o dia, a hora em que nasci, se estava chovendo, se era noite de luar, se nasci em casa ou em hospital, se chorei na hora...e tantas outras curiosidades, mas meu pai sempre me respondia assim;

-Menina, deixa de ser tão curiosa! Balançava a cabeça e sorria pra mim.
Já a minha  mãe, respondia algumas das perguntas, mas sempre de forma muito sucinta, reticente...E encerrava o assunto me dizendo:

-Querida, o importante é o que você vive hoje, não importa como estava o tempo, onde e como você  nasceu, o que interessa é que você é uma filha muito amada, mas um dia, eu me sento com você e lhe conto bem direitinho.Hoje não!Estou muito ocupada.

Bem depois, na pré adolescência, lembro que numa noite em que ele chegou do trabalho, como era de costume, foi até minha cama, cobriu-me com o lençol, deu-me um beijo no rosto e falou:

-Amanhã fará onze anos que você veio ao mundo, era um dia tão iluminado, tão bonito...Deus te proteja, minha filha!E foi saindo sem fazer barulho.
Nossa,  não posso me queixar, fui muito amada pelos meus pais e ainda sou.E mesmo completando  quarenta anos tenho certeza que cada ano vivido foi  uma soma de experiências, de aprendizado, maturidade.Sinceramente, todas as etapas que passei, valeram à pena. Os sonhos que sonhei, que vivi, que sofri, meus apelos, perdas e ganhos, amores e desamores, paixões talvez, um pouco de aventura... só sei que foram páginas de muita coisa boa, foram momentos meus, parte da minha história em processo, paisagens que desenhei no curso da vida.

Se fosse listar as tristezas, as alegrias, não caberiam em palavras a dizer, a escrever, mas o fato é que sempre acreditei que a vida tem sentido, se tiver prazer. A meu ver, é pelo prazer que sentimos, que percebemos os afagos na alma: prazer em falar, em calar, ouvir, saborear...no toque da pele, nos saberes e fazeres construídos, na arte de amar, gostar do que faz, do que se propõe a fazer, doar ou receber em todos os aspectos em que a vida nos remete, principalmente, na capacidade de  amar a si mesmo, se apaixonar por alguém, por uma profissão, enfim, pela vida.

Uma das coisas que renova minha vontade de viver, de seguir, é o fato de ser mãe, a vontade de alcançar um mundo mais humanizado, e uma das coisas que muito me entristece, é falta de compaixão no mundo, o desamor e temo por eles. Diria que além de ser mãe, ser educadora também me faz sentir feliz , pois tenho paixão pelo que faço.

Para mim, a idade cronológica não é mais importante, que o estado de espírito, porque nos dias atuais, aprendi a ver melhor, ouvir melhor, a ter mais serenidade, calor humano e até mesmo, a sentir meus pés no chão.É bom quando construímos a independência e a autonomia desde cedo. Não esperar que os outros façam aquilo que preciso fazer, não permitir que os outros decidam por mim, sobre o que diz respeito as minhas prospecções.

 Logicamente, a presença do outro é importante, porque não vivemos isoladamente do mundo, mas é preciso a consciência de que devemos caminhar com nossas próprias pernas, ter a própria opinião, desenvolver a personalidade, dizer sim quando for necessário, mas também aprender a dizer não, que muitas vezes o sim, pode repercutir em muitas dores e o não, uma atitude mais acertada, mas isto é muito relativo, depende muita de cada situação. O que não tolero, é ficar em cima do muro.

 Eis uma das minhas características: sempre sei o que quero da vida, na vida. Nunca tive medo de viver o que busquei, o que escolhi, muito embora, tenha quebrado a cara algumas vezes, me decepcionado, mas vivi. A vida é um risco e só a aproveitamos se tivermos coragem de buscar em nosso íntimo, o que move a nossa felicidade, pois é para sermos felizes que vivemos, melhor ainda quando temos o discernimento necessário, em nossas atitudes, nossas escolhas.

Sou grata a Deus, por tudo que Ele me consente, pela paz de espírito que amanheço todos os dias, sem saber explicar porque, apenas amanheço com uma leveza muito grande, uma vontade de sentir o cheiro do campo, o aroma de flor, mesmo que durante o dia, a rotina não seja como eu espere, mas sempre acordo de bem com a vida.

Assim, penso que tenho mesmo muito a agradecer. Agradecer, pelos sonhos realizados, amores conquistados, paixões correspondidas, medos superados, dificuldades vencidas, enfim, muita experiência que me ajudou a crescer um pouco como pessoa, a me descobrir, a sentir minha intraface, tocar em cálidas vozes do interior, e ouvir o som do coração, como aliado.

A vida passa, o tempo passa, tudo passa... Até algumas coisas que antes eram importantes, no presente, apenas sonhos espedaçados, memórias perdidas, ou a dicotomia do que disse antes: o que parecia ser banal, irrelevante, passa a ter mais valor, mais significado. Enfim, a vida é mesmo um prêmio.
                                                     


 

 
Antonia Zilma
Enviado por Antonia Zilma em 28/02/2010
Reeditado em 30/11/2019
Código do texto: T2112600
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