Caixa do tempo
Certo dia eu ajudei a uma amiga a "desembrulhar" a sua mais nova geladeira. Fizemos isto com um cuidado como se estivéssemos manuseando objetos raros de cristais. De fora da embalagem, eis que a " escrava branca" foi posta devidamente em seu mais novo lugar enquanto ela , a minha amiga, colocava as coisas dentro dela. Fiquei incumbido de retirar da cozinha a caixa, os isopores e os plásticos que antes envolviam a geladeira. Ela me pedira, porém, para que eu não jogasse a caixa fora, pois o filho dela, o caçula, havia lhe pedido a caixa para brincar e então levei a caixa para o fundo de seu quintal e a pus junto a outros brinquedos que espalhados lá estavam.
Eram muitos brinquedos, coisas que nunca tive em abundância na minha infância. Não tive uma infância materialmente feliz, mas posso dizer que tive uma liberdade de correr por um quintal gigantesco para mim e possuir toda a sorte de criar meus próprios brinquedos com latas de goiabada e de leite condensado e aventuras que quase traspunham os limites de uma brincadeira de criança de tão real que ela se tornava. Mas voltando ao quintal... Quando eu coloquei a caixa do lado de um velocípede, digamos, me lembrei do personagem Calvin (Calvin e Haroldo): É que ele fazia de uma caixa de papelão a sua "máquina do tempo" que geralmente o levava para o mundo jurássico de sua imaginação. Olhei para a caixa e imaginei assim também por alguns instantes. Apertei o botão imaginário e zummmmmmmmmmmmm!!! Parei num tempo onde puder rever tudo o que eu lembrava da infância que eu vivi. Vi "velhos" amigos que não vi nunca mais mais. Vi a minha escola onde eu fiquei de castigo na sacada da varanda . As casas que eu morei. Vi minha mãe lindamente jovem e também ao meu pai ,e dando pequenos saltos no tempo para rever mais coisas, eis que me vi, já homem feito olhando um brinquedo na prateleira de uma loja ao qual eu sempre desejei e nunca pude ter: um autorama. Cheguei perto de mim e disse:
-É bonito , né moço?- Eu menino perguntei.
-É sim, você tem um?- Respondi, eu homem.
-Não, ainda não. E nem sei se vou ganhar um um dia. É muito caro para o meu pai ou minha mãe comprarem.
- Mas com certeza você irá ganhar um.
- É moço, talvez sim.
Eu tinha a certeza que nunca ganharia um, mas antes de dar mais uns saltos no tempo, fiz a última pergunta a mim mesmo.
-Moço, se o senhor pudesse voltar a ser criança agora, para onde o senhor queria voltar para ser criança para brincar muito?
E então respondi a mim mesmo:
- Eu? Bem... eu queria voltar a brincar de filho com a minha mãe. Brincar de colo. Brincar de beijá-la e mais que tudo: Quando a chamasse por mãe eu ouviria ela me responder:
- Sim , meu filho!
Abri meus olhos e "desliguei" a "máquina".