JÁ CONTEI ESSA HISTÓRIA?
O melhor de ser professora foi descobrir que sou uma contadora de histórias. Eu me lembro, era uma tarde quente, os alunos inquietos não conseguiam se concentrar.A ideia veio tão de repente, que até hoje me espanto.
_ Vou tomar um copo d’água, eu disse. Volto num instante.
Pedi que alguém cuidasse deles por um tempinho. Corri à biblioteca e em poucos minutos, com a ajuda de alguns “ornamentos” me transformei. Retornei rapidinho e o susto foi geral. Nem uma palavra, só olhares fixos na figura que entrou maquiada, de capa esvoaçante, cabelos presos no alto da cabeça, brincos compridos e um lenço vaporoso. Tudo muito estranho, esquisito demais, mas que agradou de imediato.
_ Ué, quem é você? um deles arriscou.
_ Sou “Tia Mara”, respondi sem ter tempo pra pensar nada mais criativo...
_ E cadê a “a nossa tia”?
_ Foi descansar um pouco, enquanto isso, vim contar uma história. Quem gosta de história aqui?
Essa pergunta era inútil. Todos! Sempre lhes contei histórias e sabia que eram apaixonados por elas. Só que agora havia uma novidade, a contadora não tinha uniforme e não era a Marina-todo-dia! Será que ia dar certo? Sondei o clima. Estava superfavorável!
Silêncio no ar, todo mundo apostando no que estava pra acontecer.
Foi então que contei a melhor história de minha vida! Porque, para minha surpresa, “ Mara” tinha uma desenvoltura que Marina nunca teve. Foi um dos momentos mais bonitos que já experimentei. Não levei um conto de fada pra sala, eu estava dentro dele.
Foi assim que “Mara” ganhou nome e vida. Ela é sempre uma surpresa pela qual aguardo ansiosamente toda semana. Essa figura passou a reinar na minha sala e se estendeu por toda a escola. Recebe bilhetinhos e recados entregues por uma Marina que morre de ciúmes, mas aguenta firme!
“Mara” é a fantasia, o mundo do faz de conta, a representação do imaginário. E o mais bonito é que, claro, eles sabem de tudo. Apesar disso, nunca tocam no assunto associando pessoa e personagem. Querem deixar que eu acredite que acreditam. Então, depois de cada “sessão”, quando a professora de uniforme entra em cena alguém sempre comenta:
_ “Tia Mara” veio aqui, você encontrou ela por aí?
E me contam a história todinha contada por “Mara” e vejo olhos brilhando, vibrando pelo prazer de serem os primeiros a contar uma história que ainda não conheço. Momentos lindos, momentos mágicos... Houve um dia em que um deles perguntou;
_Posso encostar a mão em você, “Tia Mara”?
Aí, a personagem ficou frágil, achou que fosse morrer... Pode haver emoção maior que isso?
Agora, prestes a completar minha missão de professora, já sei o que sou: uma eterna contadora de histórias, porque para a fantasia, para o faz de conta e o encantamento, não existe tempo marcado...