A batida de carne

Será que quem inventou as regras de etiqueta realmente acredita que o Silvio Santos não come coxa de galinha com as mãos e que a Madonna não tem coragem de catar pipoca do chão e comer? Não dá para entender o motivo de tanta burocracia para tentar ser agradável para o público. Essas malditas regras são obstáculos para quem é convidado a jantar e ao mesmo tempo para quem esta recebendo visita e só servem para criar uma educação ilusória e um desconforto para ambas as partes.

Uma vítima dessa necessidade de ser educado foi o jovem Café. Um dia, estando até altas horas da noite na casa de um amigo, sua mãe convidara-o para sentar a mesa e jantar com eles. Depois de recusar algumas vezes, apesar da barriga já estar roncando a horas, ele aceitou a oferta e juntou-se à família para jantar. Se ele pudesse voltar no tempo, recusaria este convite com todas as suas forças. A refeição estava apetitosa, exceto por um pedaço medonho de carne do qual Café não gostava e não estava apto a comer naquele momento. Ele olhava para o lado e via toda a família degustando-a com uma fome voraz, entretanto ele não tinha coragem de encarar e tentar engolir a carne. Pensou em dizer ser vegetariano, mas não colaria. Um vegetariano não coloca um pedaço de carne no seu prato. Queria deixar de lado, mas sabia que seria uma desfeita. Se fosse só um pedacinho até poderia ser considerado como resto, mas o bife inteiro não colaria.

Milagrosamente uma ideia errada veio a sua cabeça: e se ele pegasse um guardanapo e enrolasse a carne nele sem que ninguém visse e depois colocasse o petisco no bolso? Não custaria nada tentar e foi o que ele fez, com extrema cautela. Após concluir minuciosamente esta missão, o jovem finalizou sua refeição, agradeceu, e nem é preciso citar que ele não quis comer uma segunda vez.

Altas horas da noite, o jovem Café decide voltar pra casa. Jovem ele já não era tanto, mas devido a sua baixa estatura física, sua idade caía para uns cinco anos a menos. Enquanto caminhava por uma rua sombria e deserta, um carro da polícia parou ao seu lado e o abordou. O jovem, sem saber o que estava acontecendo, e como não tinha nada a temer já que não portava drogas nem armas, resolveu não discutir e deixou que a polícia lhe desse uma batida rotineira e fizesse o seu trabalho, apesar do constrangimento. Ele apenas se esqueceu de um pequeno detalhe que estava escondido no seu bolso. Quando o policial colocou a mão lá dentro e tirou um embrulho todo enrolado num guardanapo sua cara de satisfação foi tremenda e ele logo foi dizendo:

- Olha só o que temos aqui! Achamos um maconheirozinho de uma figa. Isso não são horas para ficar andando com drogas por aí rapazinho. Vamos lá, me diga logo onde você conseguiu isso e o que estava fazendo com essa droga...

Porém a fala do policial foi interrompida pela sua própria cara de indignação quando abriu o pequeno embrulho e encontrou lá dentro um pedaço de carne cozida. O policial ficou sem argumentos para tentar decifrar aquilo e, sem saber o que dizer em sua defesa, Café optou pela verdade, por mais ridícula que ela fosse, e contou para o policial como aquela carne foi parar no seu bolso. Se o policial acreditou ou não, ninguém nunca saberá. Mas que ele ficou sem palavras para argumentar com Café, isso não gera dúvidas.

Este e outros causos fazem parte de uma coletânea intitulada “Curriculum Merdae”. Os personagens e estórias são fictícias e qualquer semelhança com pessoas ou eventos reais é mera coincidência.

Lalinho
Enviado por Lalinho em 22/02/2010
Reeditado em 13/01/2016
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