JANELA INDISCRETA

Pelo jeito não demorará muito para chover.
As nuvens estão carregadas.
O sol, maroto, surge entre elas, mas logo se oculta num adeus momentâneo, parecendo um jogo de esconde esconde.
Mesmo anunciando uma chuva brava, lá embaixo a vida continua e eu, daqui da minha janela acompanho o vai e vem das pessoas.
Uma senhora lava a calçada, mesmo com o anúncio da chuva. Não sei por que, talvez por mania, sei lá o quê...
Mais adiante um homem arrisca a sorte no jogo de bicho enquanto outro colhe limões num quintal ao lado.
As duas vizinhas batem boca, fazendo um alvoroço absurdo, enquanto que as crianças jogam bola na rua a espera da chuva que está por vir.
São três horas da tarde.
Um bando de andorinhas sobrevoa o céu nublado, fazendo tremendo estardalhaço.
E ela chegou...
Os primeiros pingos dão o ar da graça, anunciando a chuva que se aproxima.
Um senhor ajuda a patroa a recolher as roupas do varal, enquanto um silvo de vento, a longa distância, indica a aproximação de um vendaval.
Até os velhacos vira-latas da vida correm apavorados com o tempo escuro, obscuro e assustador.
Enquanto um homem corre apressado para guardar o carro, o vendaval chega carregando tudo o que se vê pela frente, levantando até a saia da mulata emperdigada.
A poeira passa alarmante a arrasadora, enchendo os olhos dos poucos transeuntes que ainda restam nas ruas.
Logo a chuva começa dar sinal de vida, enquanto que os pingos, antes maneiros, agora se transformam em granizos.
As pedras dão violentas estocadas nas janelas de alguns carros que ficaram desprotegidos, amassando capôs e tetos...
Do outro lado da rua, uma mulher socorre um velhinho, vítima daquele tempo.
É uma guerra de ventos e chuva que amedronta até o mais corajosos dos viventes.
O pior momento dura cerca de quinze minutos, depois a tempestade vai se dissipando, parecendo que até a ira de Deus se transformando em bondade.
As negras nuvens dão lugar a um céu azul anil em questão de minutos.
Lá embaixo um garoto faz um barquinho de papel que logo logo a enxurrada levará para um destino incerto...
Enquanto uns brincam na lama marrom e outros voltam às peladas de rua, uma mulher limpa o estrago que a poeira e a chuva deixaram.
Um homem tira o carro da garagem, enquanto outros observam e lamentam os danos que as pedras provocaram em seus veículos.
A vida vai voltando ao normal, aleluias brotam do solo, fazendo a alegria dos pássaros.
Aquelas duas vizinhas retomam a discussão, e eu, da minha janela, observo tudo lá fora, sentado em minha cadeira de rodas.

Escritor Paulista
Enviado por Escritor Paulista em 19/02/2010
Reeditado em 19/02/2010
Código do texto: T2095634
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