Apenas mais uma crônica
Permita-me apresentar-me. Sou um literato qualquer, pronto a derramar minhas experiências sob a forma de uma crônica, se é que regras classificatórias se encaixem em meus devaneios literários. Sou apenas um escritor, calejado pelas injurias desse mundo semi-alfabetizado, no sentido mais literal da palavra.
Sou uma alma encarnada que, ao ver e ouvir tantas discrepâncias em forma de imagens e sons, sente-se humilhada pelo seu próprio ego. Não que eu, em minha humilde existência, me sinta melhor do que qualquer ser vivente ou não vivente, que ouse rastejar por essas terras acaloradas, mas minha repugnância não me deixa escolha, senão sentar-me a frente de meu computador, e teclar algumas insanidades disfarçadas de palavras.
Refiro-me, caso o(a) leitor(a) ainda não tenha percebido (que, sinceramente, nem tem obrigação de tal feito), aos disparates culturais que assolam nossa mídia já tão castigada. Vemos a arte se diluir em forma de valores patéticos. Assistimos atores, cantores, humoristas e mais um caminhão de artistas que só fazem arte para si próprios ou para meia dúzia de puxa sacos que ficam babando e posando de cultos.
Lemos livros que prometem nos ajudar, mas que se limitam a tentar enfiar frases de impacto que, na prática, já estamos fadigados de tanto ouvir. Somos obrigados a sentarmos em frente à TV e, por falta de opção, assistirmos programas que não fazem nada além de nos hipnotizar e alterar nossa concepção da realidade. Vemos nossa cultura se resumir a uma arte monopolizada e desprovida de qualquer responsabilidade para com os valores éticos que sempre permearam nossas vidas. Rejeitamos nosso dia-a-dia pragmático para nos fixarmos a um mundo irreal e fictício, onde, como já dizia John Lennon, nos escondemos para fazer amor, mas somos obrigados a assistir rituais de violência gratuita à luz do dia.
Somos, por tanto, um bando de hipócritas, por acharmos lindo ver a vergonha alheia como expressão artística, e achamos ridículo quando um poema de amor é recitado em voz alta.
Sinceramente, não sei mais quem somos, mas sei quem sou. Um literato qualquer, que acaba aqui de derramar suas experiências sob a forma dessa crônica que, por essa massa cultural inutilizável, não será lida com seu devido respeito.