LUCIANA
Luciana tinha 17 anos. Se apaixonava, a cada semana, por um garoto diferente, não contava a ninguém, mas Elisandra, uma colega de classe, que parecia se afeiçoar a ela, percebia suas intenções ao acompanhar seu olhar, que acompanhava a aparição e evolução de mais um admirado secreto.
Luciana já tinha ficado com alguns garotos antes de ingressar no ensino médio, dois ou três: dois por insistência das amigas, outros por que foram muito insistentes, isso sem falar naqueles que ela inventou pra ter o que contar ou os que ela imaginou, e achava ter sido verdade.
Uma vez, Elisandra disse que conhecia uns garotos que participavam de um grupo de teatro e que ensaiavam perto de sua casa para uma musical que estrearia em breve. Luciana acompanhava com atenção cada palavra da colega de classe, mas sem deixar que ela o notasse, e começava a intuir que seria convidada para algo, o que lhe surpreendia muito, pois nunca havia sido uma garota do tipo que todos faziam questão de convidar para qualquer coisa. Logo depois de Elisandra ter terminado a valorização voluntária dos rapazes da companhia de teatro, fez o convite que se formava e que Luciana já esperava. Luciana estava explodindo de felicidade, no entanto, respondeu positivamente, mas como se não tivesse se interessado muito. Atitude que fez Elisandra enfatizar que os garotos eram muito legais e que tinha certeza que ela gostaria de conhecê-los.
Dito e feito. Eles eram as pessoas mais interessantes que ela já tinha visto, e de tão perto. Elas chegaram ao galpão onde aconteciam os ensaios e um deles, sem parar a cena em que atuava, olhou para Elisandra, Luciana e mais duas garotas que as acompanhavam e acenou para que entrassem. Eram quatro rapazes e duas moças. Encenavam algo sobre alguém muito querido que havia morrido de uma doença que ele não havia contado a ninguém, que possuía. Além de atuarem, os rapazes tocavam instrumentos e cantavam, as atrizes também os acompanhavam na cantoria. E faziam tudo com muito esmero e concentração.
Quando terminaram, se aproximaram todos, muito falantes e aparentando satisfação. As garotas se apressaram em conhecerem as meninas espectadoras, e foram elas quem as apresentaram a seus colegas de palco. As atrizes se retiraram enquanto o resto da trupe as entretia com assuntos que se alternavam tão rápido quanto as matérias apresentadas em um telejornal, as meninas quase não tinham tempo de fazer parte da conversa, mas entre um papo e outro, um deles pegava um violão que os acompanhava e aproveitava pra fazer um galanteio, enquanto o grupo de amigas fazia seu charme. Ficaram assim o resto da tarde.
Ao anoitecer, já sabiam tudo o que era urgente saber em uma amizade que começa, inclusive Luciana e Elisandra, que não sabiam mais do que o nome, a escola e turma em que estudavam e o endereço uma da outra. Então, combinaram um encontro logo mais à noite e um passeio em um lugar secreto que seus novos amigos lhe mostrariam.
Na casa de Elisandra, ela e Luciana se preparavam para o encontro de logo mais e aproveitavam pra comentar o que achavam dos meninos. A Elisandra já tinha seu affaire, coisa que já tinha ficado evidente durante o papo da tarde, mas que ela fazia questão de enfatizar. Luciana, então, falou do garoto que a tinha impressionado, por parecer, assim como ela, o mais tímido e sério. Elisandra aproveitou para confirmar a primeira impressão de Luciana e dar umas dicas que facilitariam uma aproximação. Neste momento, Luciana já começava a divagar e fazer mil conjecturas. Se sentia a pessoa mais feliz do mundo. E nunca havia se sentido assim. Em uma única tarde, havia feito amizade com uma garota, que passara a admirar, e conhecido alguém que, talvez, viesse a ser sua única paixão a se realizar. O mundo poderia acabar depois dessa noite.
Assim que os garotos chegaram, buzinaram em frente ao portão da casa dos pais de Elisandra. Enquanto desciam, se tratava de um sobrado, a amiga de Luciana explicava que já tinha conversado com o pai e que ele lhe permitira usar o carro aquela noite. Luciana achava bom, pois assim poderiam ir todos sem muito aperto. Depois de tirar o carro da garagem, Elisandra sugeriu que Luciana fosse para o carro dos atores e que um deles viesse para o seu, aquele com quem ela tinha certa afinidade. Luciana não gostou muito da idéia, pois ainda não se sentia suficientemente à vontade para ir sozinha com eles, mas respirou fundo e mergulhou no desconhecido.
Durante o caminho que levava a casa de uma das outras garotas que também esperavam por eles, os meninos faziam de tudo para deixar Luciana mais relaxada: contavam histórias engraçadas sobre eles, faziam piadas sobre os pedestres, faziam perguntas sobre ela e chagaram até a lhe oferecer um cigarro, daqueles proibidos por lei. Antes disso, Luciana já estava até falando um pouco sobre si, sinal de confiança, mas agora ficara tensa novamente, isso não. Eles eram legais e tudo, tinha um por quem ela realmente se apaixonaria, mas fumar isso aí, nem pensar. “Não, eu não fumo”, foi o que ela disse.
Depois de pegarem as duas amigas que ainda faltavam no grupo, Luciana voltou ao carro de Elisandra, onde também foram os rapazes por quem ambas se interessavam. O que estava com a amiga de Luciana trazia um garrafão de vinho entre os pés, e ofereceu um copo para cada enquanto seguiam para o tal lugar secreto. Um copo de vinho sim, não faria mal algum, até ajudaria a se desinibir. E iam conversando sobre tudo: de estudo a lazer, de família a projetos, de cidade a viagens, de namoro a amizade. Parecia mesmo que, desta vez, Luciana se veria envolvida por um ambiente positivamente favorável.
O local secreto. Era um bairro novo, ainda com poucas casas, a maioria em construção, afastado um pouco da cidade, na parte alta, de onde se podia admirar o céu noturno, que parecia mais estrelado devido a falta de luz nos postes, os garotos chamavam o lugar de mirante lunar, pois, segundo eles, pareciam estar na lua, de onde viam as estrelas mais de perto e a terra à distância. Apesar da falta de luz urbana, a noite estava clara por causa da grande lua cheia de verão que os cobria, e o que lhes faltava, complementavam com os faróis dos carros. Ali se bebeu, se dançou, se cantou, se conversou e se beijou.
Sim. Luciana estava muito feliz e à vontade, e já não conseguia, nem queria, esconder isso. Estava com o garoto por quem se apaixonara àquela tarde, com a amiga que a conquistara na mesma ocasião, no lugar perfeito para qualquer memória posterior a ser relatada com leveza, mas tanta felicidade e tanto álcool lhe traíram: sem mais nem menos se deitou no chão e começou a dizer, e repetir, quase que cantando, que gostava muito de todos que ali estavam. Elisandra dizia: “Ela tá bêbada”, os outros se entre olharam, enquanto Luciana silenciava, e repetiam: “Ela tá bêbada”. A garota feliz e apaixonada tentou se levantar, não conseguiu. Foi ajudada, se manteve em pé e correu para o terreno baldio mais próximo, onde devolveu tudo o que lhe haviam dado até então. Limpou a boca, alguém lhe deu um pouco d’água, ela fez um bochecho e cuspiu, pegou uma bala de hortelã que estava na bolsa e pôs na boca, depois disse: “Vamos pra casa?”. Todos se entre olharam, novamente, e o amigo de Elisandra disse: “Então vamos!”.
O silêncio do caminho de volta era tão denso e pesado, que se tivesse forma pareceria um bloco de concreto e se chamaria realidade: a realidade de Luciana, para a qual ela deveria voltar agora, e depois de cada novo sonho, pro resto da vida. Sempre devolvendo, no final, a felicidade em excesso.
Luciana tinha 17 anos. Se apaixonava, a cada semana, por um garoto diferente, não contava a ninguém, mas Elisandra, uma colega de classe, que parecia se afeiçoar a ela, percebia suas intenções ao acompanhar seu olhar, que acompanhava a aparição e evolução de mais um admirado secreto.
Luciana já tinha ficado com alguns garotos antes de ingressar no ensino médio, dois ou três: dois por insistência das amigas, outros por que foram muito insistentes, isso sem falar naqueles que ela inventou pra ter o que contar ou os que ela imaginou, e achava ter sido verdade.
Uma vez, Elisandra disse que conhecia uns garotos que participavam de um grupo de teatro e que ensaiavam perto de sua casa para uma musical que estrearia em breve. Luciana acompanhava com atenção cada palavra da colega de classe, mas sem deixar que ela o notasse, e começava a intuir que seria convidada para algo, o que lhe surpreendia muito, pois nunca havia sido uma garota do tipo que todos faziam questão de convidar para qualquer coisa. Logo depois de Elisandra ter terminado a valorização voluntária dos rapazes da companhia de teatro, fez o convite que se formava e que Luciana já esperava. Luciana estava explodindo de felicidade, no entanto, respondeu positivamente, mas como se não tivesse se interessado muito. Atitude que fez Elisandra enfatizar que os garotos eram muito legais e que tinha certeza que ela gostaria de conhecê-los.
Dito e feito. Eles eram as pessoas mais interessantes que ela já tinha visto, e de tão perto. Elas chegaram ao galpão onde aconteciam os ensaios e um deles, sem parar a cena em que atuava, olhou para Elisandra, Luciana e mais duas garotas que as acompanhavam e acenou para que entrassem. Eram quatro rapazes e duas moças. Encenavam algo sobre alguém muito querido que havia morrido de uma doença que ele não havia contado a ninguém, que possuía. Além de atuarem, os rapazes tocavam instrumentos e cantavam, as atrizes também os acompanhavam na cantoria. E faziam tudo com muito esmero e concentração.
Quando terminaram, se aproximaram todos, muito falantes e aparentando satisfação. As garotas se apressaram em conhecerem as meninas espectadoras, e foram elas quem as apresentaram a seus colegas de palco. As atrizes se retiraram enquanto o resto da trupe as entretia com assuntos que se alternavam tão rápido quanto as matérias apresentadas em um telejornal, as meninas quase não tinham tempo de fazer parte da conversa, mas entre um papo e outro, um deles pegava um violão que os acompanhava e aproveitava pra fazer um galanteio, enquanto o grupo de amigas fazia seu charme. Ficaram assim o resto da tarde.
Ao anoitecer, já sabiam tudo o que era urgente saber em uma amizade que começa, inclusive Luciana e Elisandra, que não sabiam mais do que o nome, a escola e turma em que estudavam e o endereço uma da outra. Então, combinaram um encontro logo mais à noite e um passeio em um lugar secreto que seus novos amigos lhe mostrariam.
Na casa de Elisandra, ela e Luciana se preparavam para o encontro de logo mais e aproveitavam pra comentar o que achavam dos meninos. A Elisandra já tinha seu affaire, coisa que já tinha ficado evidente durante o papo da tarde, mas que ela fazia questão de enfatizar. Luciana, então, falou do garoto que a tinha impressionado, por parecer, assim como ela, o mais tímido e sério. Elisandra aproveitou para confirmar a primeira impressão de Luciana e dar umas dicas que facilitariam uma aproximação. Neste momento, Luciana já começava a divagar e fazer mil conjecturas. Se sentia a pessoa mais feliz do mundo. E nunca havia se sentido assim. Em uma única tarde, havia feito amizade com uma garota, que passara a admirar, e conhecido alguém que, talvez, viesse a ser sua única paixão a se realizar. O mundo poderia acabar depois dessa noite.
Assim que os garotos chegaram, buzinaram em frente ao portão da casa dos pais de Elisandra. Enquanto desciam, se tratava de um sobrado, a amiga de Luciana explicava que já tinha conversado com o pai e que ele lhe permitira usar o carro aquela noite. Luciana achava bom, pois assim poderiam ir todos sem muito aperto. Depois de tirar o carro da garagem, Elisandra sugeriu que Luciana fosse para o carro dos atores e que um deles viesse para o seu, aquele com quem ela tinha certa afinidade. Luciana não gostou muito da idéia, pois ainda não se sentia suficientemente à vontade para ir sozinha com eles, mas respirou fundo e mergulhou no desconhecido.
Durante o caminho que levava a casa de uma das outras garotas que também esperavam por eles, os meninos faziam de tudo para deixar Luciana mais relaxada: contavam histórias engraçadas sobre eles, faziam piadas sobre os pedestres, faziam perguntas sobre ela e chagaram até a lhe oferecer um cigarro, daqueles proibidos por lei. Antes disso, Luciana já estava até falando um pouco sobre si, sinal de confiança, mas agora ficara tensa novamente, isso não. Eles eram legais e tudo, tinha um por quem ela realmente se apaixonaria, mas fumar isso aí, nem pensar. “Não, eu não fumo”, foi o que ela disse.
Depois de pegarem as duas amigas que ainda faltavam no grupo, Luciana voltou ao carro de Elisandra, onde também foram os rapazes por quem ambas se interessavam. O que estava com a amiga de Luciana trazia um garrafão de vinho entre os pés, e ofereceu um copo para cada enquanto seguiam para o tal lugar secreto. Um copo de vinho sim, não faria mal algum, até ajudaria a se desinibir. E iam conversando sobre tudo: de estudo a lazer, de família a projetos, de cidade a viagens, de namoro a amizade. Parecia mesmo que, desta vez, Luciana se veria envolvida por um ambiente positivamente favorável.
O local secreto. Era um bairro novo, ainda com poucas casas, a maioria em construção, afastado um pouco da cidade, na parte alta, de onde se podia admirar o céu noturno, que parecia mais estrelado devido a falta de luz nos postes, os garotos chamavam o lugar de mirante lunar, pois, segundo eles, pareciam estar na lua, de onde viam as estrelas mais de perto e a terra à distância. Apesar da falta de luz urbana, a noite estava clara por causa da grande lua cheia de verão que os cobria, e o que lhes faltava, complementavam com os faróis dos carros. Ali se bebeu, se dançou, se cantou, se conversou e se beijou.
Sim. Luciana estava muito feliz e à vontade, e já não conseguia, nem queria, esconder isso. Estava com o garoto por quem se apaixonara àquela tarde, com a amiga que a conquistara na mesma ocasião, no lugar perfeito para qualquer memória posterior a ser relatada com leveza, mas tanta felicidade e tanto álcool lhe traíram: sem mais nem menos se deitou no chão e começou a dizer, e repetir, quase que cantando, que gostava muito de todos que ali estavam. Elisandra dizia: “Ela tá bêbada”, os outros se entre olharam, enquanto Luciana silenciava, e repetiam: “Ela tá bêbada”. A garota feliz e apaixonada tentou se levantar, não conseguiu. Foi ajudada, se manteve em pé e correu para o terreno baldio mais próximo, onde devolveu tudo o que lhe haviam dado até então. Limpou a boca, alguém lhe deu um pouco d’água, ela fez um bochecho e cuspiu, pegou uma bala de hortelã que estava na bolsa e pôs na boca, depois disse: “Vamos pra casa?”. Todos se entre olharam, novamente, e o amigo de Elisandra disse: “Então vamos!”.
O silêncio do caminho de volta era tão denso e pesado, que se tivesse forma pareceria um bloco de concreto e se chamaria realidade: a realidade de Luciana, para a qual ela deveria voltar agora, e depois de cada novo sonho, pro resto da vida. Sempre devolvendo, no final, a felicidade em excesso.