LIVRE E LOUCA

Às vezes penso que deveria ter nascido louca. Ou, talvez, ir endoidecendo com o passar dos anos é lá pelas tantas pirar completamente.
É que a loucura é tão necessária nestes tempos que em que todos buscam ser enganosamente normais demais.
Acho que tudo que é demais é insensato, e a insensatez não é senão a loucura introvertida.
Acabo achando esta normalidade muito chata! Todos tão loucamente tímidos e sem graça.
Afinal, de neurastênico, esquizofrênico, esquisito todo mundo tem um pouco, embora só quem ouse admitir passe a ser louco.
Então, penso que se fosse legitimamente diagnosticada por um analista, que se diz coerente e acha que todos aqueles que mergulham em seu divã são comprovadamente dementes, eu seria livremente louca da cabeça, de sangue... Só não seria louca de pedra, pois minha insanidade vem do coração e, assim, seria pulsantemente doida e feliz.
Só eu sei o quanto sofro por não poder surtar como queria.  Já tentei terapia e até regressão. Pedi alta ao psiquiatra: “com licença, ser certinha é o que me mata”.
Não preciso de pílulas, adoro dormir. Muito menos de estimulantes, adoro viver. Mas preferia ser louca, um tiquinho que fosse, só para poder fazer.
O quê?
Tudo aquilo que só quem é louco pode.
Não preciso listar para você, basta pensar em tudo que já sentiu vontade e não pode fazer, por não ser. Ou melhor, por não ser atestadamente insano, pois loucura você tem de sobra.
Por estas e por outras que acho que sou um embuste, uma fraude, um engano. Afinal, desejo infringir, o tempo todo, a lei da normalidade sem culpa, mas como uma cidadã dita normal não posso.
Me delato!
Que me condenem e me classifiquem na condição de portadora de desvario crônico. Que me registrem alienada, alucinada, insensata. Que me digam maluca, pirada, tantã. Que me xinguem lunática, delirante, lelé.
Só não me internem!
Não tenho culpa de ser como sou.
Nasci aparentemente normal, só depois resolvi que queria ser escritora.
Por isso, peço que me permitam ser ilimitadamente livre, e, suficientemente louca.


Léia Batista
Enviado por Léia Batista em 12/02/2010
Reeditado em 13/02/2010
Código do texto: T2083826