QUE SE DANE A MELANCOLIA!

Nunca quis amizade com a tristeza ou com sua prima, a nostalgia, refletindo comigo mesmo ser deveras bem melhor delas afastar-me de uma vez por todas. Ambas, contudo, insistentes, costumam rondar-me incessantes, pacientes, certas de que mais dia menos dia conseguirão aterrissar no portal do meu coração para fazer aquela farra homérica. Não dou muita chance a elas, é bem certo, prefiro sempre esquivar-me de seus desencantos procurando as ruelas e vielas da alma onde certamente encontrarei resquícios lúdicos de alegria insofismável que me darão suporte para enganá-las e delas escapar. Às vezes por um triz. Bom, naturalmente aqui e ali, quando menos espero, tropeço em suas sombras e garras nada amigáveis, ainda assim repentinamente pulo fora a quase cair, claudicando num pé e noutro até equilibrar-me e safar-me de seus olhares tendenciosos.

Claro, estar triste e melancólico pode ser somente mero estado de espírito passageiro, sentimento surgido dalgum incidente não muito melodramático, dum sorriso apagado ao luar, talvez de palavras inesperadas ditas ao sopro da brisa e capazes de magoar. Nada determinante, porém, de alguém sentir-se presa permanente desses momentos. Estar perplexo não significa em hipótese nenhuma continuar atônito ao longo das horas. Porque, apesar de tudo, as ondas vão e vêm incansáveis, as coisas simples são levadas pelas correntes de ar do cotidiano, e a doçura do sorrir retorna com a mesma facilidade do seu indesejado desaparecimento. Se lágrimas descerem ao longo das faces, aí está, é o desafogo do peito abrindo suas comportas para o desaguar da amargura congestionante

Quando a cumplicidade une o estar triste com o imergir no oceano da melancolia a ponto de descer o abismo da depressão, então é hora de tentar o impossível para sair de seus tentáculos subjugantes antes que seja por demais tarde. Depois da irremediável queda no fundo do poço fica realmente difícil à beça voltar à tona, buscar respirar à guisa de outrora. É que as amarras da desilusão não são fáceis de ser desatadas, são nós cegos molhados e enrijecidos para dificultar o seu desenlace. Por conseguinte, eis-me passando longe, bastante distante mesmo, dos rastros de seus botes traiçoeiros. Aliás, não dou a menor bola, a mais ínfima atenção a esses caminhos bruscos que emperram o prazer e tolhem a felicidade. Sou assim, ó, unha e carne com o viver feliz, risonho, cantando ao sol e à chuva, passista número um do bloco da alegria. Nunca, jamais pensarei em ser nem mesmo conhecido - vizinho nem pensar! - da tristeza ou da melancolia. Que as duas se explodam e se transformem em milhões de fragmentos de lindos sorrisos qualquer dia desses. Ou, então, virem nichos de fantásticas fábricas de chocolate de cacau puro, sem açúcar. E tenho dito!

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 12/02/2010
Reeditado em 12/02/2010
Código do texto: T2082793
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